A empresa

Mordiscou os lábios. 12:30. Quarenta minutos de atraso, inadimissíveis quarenta minutos. – Transito desgraçado. Um passo a cada três minutos.

– Eu lamento Jorge, mas não posso largar o carro no meio do tráfego. Por que não remarca essa reunião?
– Você só pode estar brincando! Sabe quantos milhões estão em jogo com o fim desse encontro?! Não podemos ter nem mais um dia de atraso!
– Que se dane! Vou chegar aí em 15 minutos, podem esperar. – Jogou o aparelho celular para o banco do carona.

Tomou a calçada, não queria saber das consequências. Acelerou, quase bateu em uma árvore, por pouco não atropelou os pedestres. Nada deixaria ela longe da promoção mais significativa da carreira – e já teve muitas etapas importantes na sua vida profissional.

Cinco minutos mais tarde, bem mais cedo do que esperava chegar, estacionou em frente ao monumento de vidro. Antes de sair, pegou seu batom vermelho, retocou as falhas feitas pela ansiedade do trajeto, ajeitou os belos cabelos loiros, e saiu em direção ao último andar.

– Sala da diretoria, por favor. – Mesmo anciosa sua aparencia não denunciava seu estado. Seu sorriso enigmático e a voz macia, conferiam-lhe ar sereno.

– Estou subindo Jorge, mais trinta segundos. Prepare minha cadeira.

Bateu o telefone e olhou-se no espelho do elevador. Consigo mesmo dizia nessa fração de segundos:

– Preparada minha querida?
– Não me resta dúvida da resposta – Disse baixinho.

Caminhou pelo corredor principal com a maleta na mão, com o passo mais firme que nunca. Abriu a porta rapidamente, não olhou para os lados em nenhum momento. Sentou-se na sua cadeira de costume ao lado do presidente da companhia. A vice-presidente, logo confortável em sua cadeira, disse com voz sisuda:

– Perdoem-me a demora, o tráfego estava um inferno. – Não prolongou muito as descupas – Sérgio, quais são as nossas realidades na contabilidade – Apontou a caneta dourada para o colega de equipe um pouco a frente, a sua direita.

Sérgio era experiente: 22 anos de profissão deram a ele visão de futuro, seja em qualquer mercado, estável ou instável. As moedas poderiam estar inseguras, mas ele não:

– Não vou enganar vocês, nossa situação é difícil, a perda de clientela têm nos deixado por baixo.

Viviam pareceu não dar atenção a uma das vozes mais respeitadas da empresa:

– Claudio, qual é a nossa força de trabalho? – Dirigiu-se ao rapaz mais afastado da esquerda.

– 35 mil homens, 15 mil mulheres. 3 unidades, além desta central.

Viviam não pensou muito, pediu para que todos saissem. Deixando ela e Jorge, o presidente, a sós.

– Sabe que sua decisão pode te dar o maior cargo da companhia. Diga-me o que pensa em fazer.

– Passar o pente nos meus cabelos.
– Como? – Jorge não estava impressionado, mas sorriu gostamente.
– A malha fina da companhia. Vamos tirar os gordos que comem rosquinhas de trás de suas cadeiras, tirar seus ar-condicionados e pôr todos ao trabalho. – Jorge levantou a sobrancelha direita – Tem mais, proseguiu a aspirante à presidencia – Cortaremos a força de trabalho masculina pela metade e aumentaremos a força feminina em 45%.
– Tem certeza?
– Ela o encarou seriamente nos olhos – Veja, – Viviam apontou as planilhas de levantamento – as mulheres produzem dois produtos a cada 5 minutos, os homens, levam 7 minutos para produzir o mesmo. Temos perda significativa no final do semestre.
– Certo, vamos testar seu esquema e no próximo bimestre montaremos novo encontro.
– Testar?! Você sabe o quanto suei para chegar neste posto?! Não fosse por um prefixo besta, temos os mesmos cargos. Você não me “testou” em nenhum momento.
– Vamos decidir isso de outra forma então.

Toda aquele stresse incomodou os dois cargos mais importantes de uma empresa com um futuro incerto, mas às portas fechadas, deram vazão ao que desde que se encontraram, como meros empregadinhos da mesma fábrica, desejavam fazer. Elevaram seus lucros, luxúrias e juros sexuais a uma margem de lucro fora de questionamento.

Sétimo andar

Entrou no prédio correndo. Atravessou o hall num piscar de olhos. Pegou o elevador.
– Para qual andar senhora?
– último
– Pois não
Assim que o rapaz virou-se ela foi categórica em lhe dar um beijo. Estavam a sós na cabine. Duas cameras no alto gravavam a cena. Chegou ao destino. Largou do jovem num salto e partiu para aquilo que deveria fazer. Hoje. Agora. Nesse exato momento. No corredor, avistou a sacada.

– Vamos!
– Temos razões para acreditar que ela entrou naquele edifício, vamos depressa!
– Portaria do Edificío salazar, com que morador deseja falar?
– Polícia. Precisamos entrar.
– Um momento. O porteiro olhou para o televisor que gravava as imagens da rua. Dois policiais estavam na porta exibindo suas crendencias oficiais. A porta foi destrava e aberta.
– Uma mulher ruiva, com mais ou menos 1,80 cm entrou a pouco aqui?
– Sim, a senhorita Júlia. Mora no 302.

Os policias foram correndo ao elevador mais próximo.

– Com licença, poderia me informar para que andar a senhorita Júlia do 302 desejou ir a pouco? – Esse foi o nome que ela deu aos funcionários do hotel, pensava o policial.
– Pois não, estranhamente ela foi para o último andar. Ela deveria parar no terceiro, mas não foi o que…
– Precisamos chegar até ela o mais rápido que esse elevador puder subir! AGORA!

Em questão de minutos estavam no andar desejado.

– César, mire os refletores próximo ao sétimo andar. – O colega foi avisado pelo rádio. Se estiver vendo uma pessoa na sacada, não aponte a luz diretamente para ela, entendeu?
– Certo, senhor. – Alguns segundo se passaram e então ele retornou: Sim, parece ser ela.
– Estamos perto dela também, vamos tentar uma abordagem amigável.

– Já devem estar aqui. Não vou perder tempo. Não aceito ser trancafiada, nasci livre e livre serei, nem que for na eternidade. Jogou-se.

– Não foi possível fazer nada, ela se jogou.
– Ela morreu! Tudo muito rápido, não conseguimos salvá-la.

Causa mortis: Suicídio
Motivo: Não declarado
Passagem pela polícia: Assassinato, furto, depredação de patrimonio público, perturbação à ordem e à moral pública, atentado violento ao pudor, abuso sexual, tráfico de drogas, formação de quadrilha, sequestro.

Falta de amor. Não teve vida digna, sem enterro decente. Na eternidade seria mais feliz…