Prato principal

Estou me alimentando
da sua poesia,
da sua música,
da palavra certa

Meu corpo reproduz
a energia que chega,
não dá pra viver
com a alma seca

Bebo seus versos,
seus meandros,
estou me alimentando
para matar – viver –
o significado da palavra

Ainda vaga, um doce,
palavra limitada,
prato de entrada,
cortesia na saída

Só quem ousa levá-la
ao prato principal – poeta –
morto de fome, vive respirando,
observa, constrói poema
e vai soprando,
vida quente.

Poesia favorita

Sua leitura assídua
recria em minha poesia
a fonte de inspiração
reinventada e revestida
do brilho nos seus olhos,
energia bendita

Minha poesia favorita
tenho tanto pra contar,
temos tantas linhas ainda
será… será… seria de imediato
ou é poesia metalinguística?

Percebo, independente de tudo, energia que flui,
ansiedade, necessidade, libido,
que a sua leitura possui

E eu, encantado com tudo isso, vejo um ponto de luz,
sei que há energia no átomo,
princípio de todos os casos,
o choque das partículas conduz

Vejo a epiderme arrepiada
e o firmamento de madrugada
como parentes próximos,
são milhares de pontos,
esse desejo reluz

Como o êxtase e o desespero
pela fuga das palavras pelos dedos,
sei que você me entende e recupera,
na sua leitura agitada e ansiosa,
o primor do prazer potente
que une quem estava separado
pelo destino valente,
capaz de preparar você e eu
para um encontro frente a frente

Dois apaixonados pela poesia
porque ela explode feito o big bang,
e nos aproxima, apropriando-se da gente

Para Thalisson Noberto

Perto de mim

Tive um insigth com seu nome,
uma energia forte rasga todo o meu corpo,
eu sei que faz anos, não esqueci do seu rosto

Recorri ao passado
sob horas adentro,
a madrugada foi um fato
pequeno

O que é uma noite de música
perto de pretéritos anos,
seu carinho ficou guardado,
um amor que foi se recuperando

Sei que esse poema é pouco
para o que eu tenho a dizer,
sei de tudo um pouco
e do muito que é o zelo por você

Nossa cantora nos uniu e nos separou,
estradas dessa vida que tomaram rumos distintos,
mas meu instinto não sossegou

Minha alma, meu amigo querido,
não desgrudou do seu apreço
e sei de um fato:

a vida fez um contorno
para eu ter sua mão de novo
aperta, perto de mim

Assim que eu te quero,
não vai mais embora,
fica comigo, fica comigo agora

Sinto tanta paz em meu peito,
você tem uma energia leve
dessas que quando a gente sente
cabe ao poeta apenas a prece,
a prece do poema

————-
Para João Pedro Oliveira, amigo de longa data.

Sentimento histórico

Não vamos em um primeiro momento
de relacionamento amoroso
Tocar nesse assunto de imediato,
é um fato, um desgaste horroroso

A amizade deve vir primeiro
para a construção do solo sólido,
e não de uma rocha porosa
de um envolvimento precoce,
percebido por expectativas

Conhece o terreno,
arqueologia d’alma
que se descobre empática
pela sua voz doce e válida
para comparar a veracidade
dos seus lábios esparramados
em um sorriso que diz muito
para os dois envolvidos,
convite aos antigos,
desejos desenterrados
ainda vivos

Semente

Fora que eu já chego
meu corpo é seu maior apelo
sinto que não me tenha
sou ferrenha quando amo,
alma sedenta

Sou as garras de fora
ousada, não bato a porta
convido para se entregar

Não aceito chá, nem calmante
não fumo, nem bebo, seduzo,
não sou cartomante

Confundo seus sentidos
com meu corpo rígido,
sem expressão

Sensualizo de outra forma,
não mostro o meu corpo,
nem minhas pernas vulgares

Sei que de tudo sou de fato
melhor que seus muitos ares,
mesmo que não lhe dê confiança

Não sou a vendida da esquina
fácil como nota de cinco,
não me faço rara como nota de cem,
sei que não valho,
não sou comparada nem comprada por ninguém

Seu status não me encanta,
seu dote não me anima
não sou santa, mas seu crachá de bacana
não levanta o ânimo, sinto muito

Se isso é o que lhe prende, aprende
que eu não preciso desse seu corpo doente,
dessa mente perene, atitude que não muda

Sou muda, filha do meu próprio ventre,
astuta, vivo o sempre e o sempre da semente
que nasce, cresce e cai,
reinventa-se

Escolha nítida

Quando eu finalmente
pus os meus pares de óculos
sob a mesa esta noite
contemplei, inesperadamente,
com a vista turva por falta de correção
que a minha escolha por você, por amor,
não se justifica, mas mesmo assim é.

É sim, sei que é uma forma dolorida,
incômoda, não só aos meus olhos,
– também à mente -, essa constatação
reflexivamente, chata

Ora, porque eu não sou nenhum idoso
capaz de abaixar os corretores da vista
para pensar, repensar a vida, simplesmente!

É sim, sei que é incoerente tirar os óculos
e escrever, redigir com a forçosa falta de nitidez
sobre alguém que eu escolhi sem critérios
com a visão perfeita e limpa

Ora, mesmo que fingida por aparelho,
com essa falsa tecnologia do vidro
que tudo expande e esclarece,
– refletido olho cru no olho espesso –
o que não teve justificativa de enxergar!

Cruz e fixo

Para Luiz Claudio Abreu – Instituto Federal Fluminense – Licenciatura em Letras pelas disciplinas de Trabalho e Educação; Psicologia da Educação e Teorias da Aprendizagem nos três semestres iniciais desta graduação.

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Não quero a palavra
como carícia sutil,
não quero a palavra
como vilã, nem nada
arma do enunciado

Resguardo o princípio do respeito
seu credo, seu batuque, seu apelo,
suas duas mãos juntas, seus lábios
unidos em orações decoradas

Não tenho a verdade isolada,
alicerçada em qualquer único Deus
oriente, ocidente ou medieval,
nem as perguntas filosóficas
que formaram a base da ciência
puderam me responder

Recorro à mitologia
ou às palavras bíblicas?
Elas se equivalem ao desconhecido?

Sou homem esculpindo arte
com base em que tipo de sujeito
de que material é feito meu espelho,
de onde eu me olho, sou perfeito?

Nos mitos, nas cavernas,
nas indagações aristotélicas,
nas águas do rio de Heráclito,
nas ruínas do Egito, hieróglifos,
achados romanos da força,
na Palavra que atravessa os séculos,
antes ou depois de Cristo

Cruz e fixo, dono da verdade?

Serviu

Da dimensão do seu sorriso,
pude sorrir contigo
quando o meu corpo,
minha mente e espírito
careciam de tudo,
principalmente, abrigo

Do mistério dos seus olhos
pude observar o que agita,
sua pupila encontra a minha,
investigativa

Da suavidade dos seus lábios,
pude tomar por certeza esse sabor,
mesmo tímido e deslocado
há necessidade da palavra

Da sua pele, não digo nada
que o tempo ainda não permitiu,
se sou assim humano,
se sou assim um fardo,
do cansaço, sua mão surgiu

Do seu afago abençoado,
inesperado e gentil
sou de todo um sortudo,
tendo a piedade da vida,
notando o quanto o outro pode ser vil

E se sirvo para você também de agrado
meu poema ainda não perdeu o significado,
de um modo ou de outro, a cada um de nós,
serviu