Silêncio

Minha palavra não me protege
todo mundo fingiu que não viu,
todo mundo está calado,
nenhuma fala na família,
nenhuma palavra nas escolas,
nenhuma menção no trabalho,
nas redes sociais, nenhum manifesto

Detesto.
O silêncio impune.
Ao menos cinquenta vidas,
humanas, perdidas,
Fobia de homem
fobia de mulher
fobia de amar quem se quer

Silêncio.
Minha palavra não me protege
Poesia de morte de iguais,
de iguais que amam diferente

Um massacre desumano
por ser quem somos
humanos

Fica o manifesto para os homens
civilizados, que usam o lado humano
de respeito ao próximo

Caixões com pano de fundo colorido
hoje, preto e branco.
Não só em Orlando.

Partindo o poema

Tem gente que pergunta
porque eu não escrevo em prosa
se o meu estilo de poema
é quase uma conversa contínua

E eu continuo respondendo
que a escolha não foi minha.
A poesia me domina completamente.

É o meu pensamento que já flui rimando,
na minha fala, se der bobeira,
vai no ritmo do poema
essa cadência melódica
no meio do verso

Eu não me obrigo pela rima
no final de nada, esperada
se acontecer, se rolar
eu não percebi

Eu vivo assim: Deixando a palavra,
levado pelo nada da palavra
sem causa pensada…

É que a prosa tem outros recursos,
tem que amarrar nas linhas,
tem que pontuar as vias,
criando estrada, meio de transporte
corrido para a arte

Na poesia, não
eu me esparramo,
eu me espreguiço,
estou solto e vívido

Na poesia eu amo com mais intensidade,
carrego doce e sutil para a surpresa,
a dor e a delicadeza em seus extremos

Sou enfermo desse momento
de febre poética
e não desejo a cura,
não desejo sobreviver

Deixa eu partir com o poema
que ele está perto do fim
por enquanto…

Turista emocional

Não sei o que está acontecendo comigo. Volto as origens de um blog, diário virtual de um jovem solitário. Tudo bem, não há como retornar plenamente aos moldes desse tipo de página que teve início no começo dos anos 90. Hoje, tudo aqui que parece uma resenha de um adolescente em crise pode ser simplesmente ficção. A juventude anda bem criativa, atualmente.

História inventada ou realidade de fato, não importa. Nem que eu diga usando o pronome “Eu”, estaria falando de mim. Poderia ser o eu-lírico, quem sabe. Enfim, enquanto você fica decifrando se é pessoa ou persona a escrever, vamos aos conflitos emocionais:

Acho que estou muito desanimado hoje, com o coração pesado e cheio de dúvidas. E é tão complicado quando a alma se pergunta… Tão inquietante ficar sem respostas. Em certos momentos tenho a certeza plena de que sou amado, outras nem tanto, e algumas vezes, é absoluta a negativa. Eis o momento em que me encontro. Ou que não me encontro.

Não reconheço mais o zelo, o carinho, a doçura. Não me tem total segurança mais. Meu porto-seguro está sendo trocado pelo caos aéreo de minha mente que insiste em viajar nas nuvens das incertezas. Mesmo que seja me dada toda e qualquer certeza durante muito tempo. Mas o momento que piso em falso é o que mais me abala, aquele que tem mais impacto.

Então há sangue. Porque o simples arranhão na incerteza tem aumentado. As bactérias da insegurança dançam em minha carne. É hora da festa daqueles que tanto me tem invejado. Tudo se abre, e a medida que fico com o peito exposto, sem resposta, a ferida ganha proporções gigantescas.

Choro baixinho. Os sonhos foram ilusão, concluo. Todos eles. Cada plano, cada cena, todos os momentos. Não existem mais os sorrisos das brincadeiras que pensei em fazer, pois sabia que riria; não há mais os lugares que iríamos juntos, nem o mar que pretendia te levar a observar; o sorvete que dividiríamos derreteu; as canções que gritaríamos por tamanha alegria já desafinaram.

Então eu acordo. A ira me domina. O tempo perdido, tantos planos jogados fora, tudo em vão. Já não há choro contido, as lágrimas correm sem barreiras. Meus lábios ganham vermelho-sangue, os olhos, a carne viva. O animal se rebelou, saiu de sua jaula emocional e já não come na mão de turistas. Como você tem sido sempre, em mim, enfim.

Passado, presente, futuro

Não viva do passado sem olhar o presente e nem desejar o futuro. Não esteja no presente sem esquecer-se do tempo que passou, mas não deixe de fazer planos para o amanhã. Pense no amanhã, mas não se esqueça do hoje, tão pouco banalize sua história. Esse é o grande lema do ser humano.

Quando, exatamente, viver passado, presente e futuro. A que horas eu visito o ontem, o hoje e o amanhã. Não é tão simples como tomar café da manhã, almoçar e jantar. Seria muito mais simples se achassem o ponto que separam esses três momentos. Não são estações do ano infelizmente. A única parada que nos resta da viagem da vida é uma decisão. Desço para visitar minhas aparentes-parentes-lembranças, construo mais trilhos para ir a diante, ou penso já em outro veículo de transporte.

Equilíbrio. O que sou, depende do que fui, e só fui porque pensei em ser, e só serei construindo o meu ser que já se transformou. Ligação. Pensamento. O fato, na verdade, é que só nos damos conta destes três instantes quando não vivemos nenhum deles. Quando paramos para construir a faixa que separa cada um dos três tempos.

Passado. Perfeito pefeito, imperfeito ou mais-que-perfeito. Só há estas denominações porque foi preciso viver para conjugá-los de maneira adjetiva. Presente. Não se sabe, só se vive; não tem ramificações, apenas estar aqui, escrevendo, sendo, agindo. Futuro. Do pretérito ou do presente. É futuro afinal. Só se pode mencionar o que já se foi, ou o desejo daquilo que se vive. É com base nos dois outros modos que se determina se faremos um futuro com consequências do passado ou do presente. Mas é o único tempo, no entanto, que pode transformar os anteriores.

Enfim, cabe apenas a imatura conclusão daquele que não sabe o que o futuro leitor concluirá por si mesmo: Em que momento fazer do clichê humano algo que já não se deve mais observar? Qual instante determina que se deva pensar ao assunto? E em qual, por fim, momento deixar estas indagações mais adiante?

Ora, se eu soubesse a resposta, não valeria de nada meu passado; porque dele já teria me desprendido. De nada valeria meu presente se já soubesse de antemão os rumos da minha vida. E o futuro seria esperado sem a menor das emoções…

Posse da vida

Dilma Rousseff, eleita primeira Presidententa da República Federativa do Brasil.

Comoção. É essa a palavra que mais se encaixa no contexto do primeiro dia do ano de 2011. É inevitável não mencionar a posse da primeira mulher a tomar cargo do maior posto de uma nação. E seria, sobretudo, irracional passar despercebido por este feito que marca a política nacional.

Mas, apesar de grande e extremamente emotivo momento, ressalto que não me agrada tal assunto. Apesar, é claro, de não ter sido literalmente irresponsável se não o assiste. Mulher. Essa palavra hoje, a partir deste dia, nunca teve tamanho peso para esta nação, e, mais que olhar para cima, para o cargo máximo, eu prefiro olhar para os lados.

Agradeço às mulheres que me cercam e que me ensinam a ser homem. Porque a elas se deve a vida em seu mais nobre ato. A elas se deve o carinho da criação materna, à educação familiar e social. A dedicação ímpar no trabalho – nas suas mais variantes e extensas formas e feitos.

Ser mulher. Não basta ser amiga, esposa, companheira, professora, mãe. Não basta ser carinho e fraternidade. Não basta ser fonte de admiração poética, cultural e inspiração ao longo de séculos. Foi preciso ser também dura – característica tão irraizada ao sexo oposto. Flexibilidade e agilidade de ser mutável. Isso é ser mulher, ser humana.

Porque tudo agora, ao menos por enquanto, ao menos nesse país, terá o feminino fortalecido. Pai e mãe, filho e filha, tio e tia, sobrinho e sobrinha, primo e prima, avô e avó, neto e neta, presidente e presidenta. É preciso olhar a nação com base na família. Na base de toda a pátria, seja ela democrática ou não.

Bom, o nome do momento é Dilma Rousseff. Mas eu quero que você perceba que não apenas temos uma dama com uma faixa no peito. Já possuíamos há muito o peso de um milhão de faixas sob o seio de uma mulher. A responsabilidade de fazer do recém-nascido um cidadão. A missão de fazer deste cidadão um ser justo e sábio.

Não sejamos ingênuos de pensar que só agora temos uma mulher na tarefa árdua de liderar. Porque já é sabido que elas lideram a casa, a criação, que só a mulher detém do dom de ser astuta, e ao mesmo tempo doce nas situações de mais complexo conflito. Porque ela já sabe, naturalmente, o que fazer quando dois filhos brigam. Só ela tem a capacidade de ser doce e prender a atenção gostosamente de trinta jovens dentro de uma sala de aula.

Os homens que me desculpem, mas é hipocrisia de minha parte não exaltar o devido valor que esse sexo representa. Ser mulher vai além de uma presidência, de um cargo. Ser mulher vai além de comandar a casa, instituições, empresas, setores.

Ser mulher é liderar a humanidade. Afinal, podemos ter a mais organizada das sociedades, a mais democrática das nações e o mais transparente dos povos, mas, cabe a mulher, e apenas a ela, voltando a mais elementar das observações deste autor, a origem da vida. E eu pergunto a quem ler este texto:

O que é um cargo de presidente, ou presidenta, como se tem agregado recentemente, perto daquele que dita a porta de entrada para a vida?

Novos números

Conversando com amigos hoje de manhã, estava apresentando as estatísticas do blog para me gabar. Afinal, sou um dos poucos que produz conteúdo na internet no país, diria na faixa de 20 por cento em relação a 80 pontos percentuais que apenas consomem, numa estatística mental rápida. Claro que isso se deve também ao número de pessoas com acesso à rede mundial, ou que estejam conectadas por um período de tempo razoável que sejam interessadas à produção de páginas.

Mas como não estou muito animado para discutir questões sociais e as melhorias decorrentes do governo dos últimos oito anos, até porque detesto política, além de me prender muito à informática, voltemos as estatísticas. Apesar de que falar de números é muito melhor que calculá-los. Estou reclamando bastante nesse post. Talvez esteja me perdendo, mas e daí. A página é minha e eu não usei interrogação nenhuma até agora.

Resumindo todo esse monte de palavras, o que é o tempo? Tudo bem, não resisti, foi só falar que não usei e aqui está a dama das indagações. Bem abusada ela, já que só pergunta e nos deixa sempre com a pior parte. E às vezes o ponto final não tem final. E se você combiná-lo em trio, teria uma reticências. O que, na verdade, é o ponto final com preguiça de se finalizar.

O dia, 24 horas. A semana, 7 dias, o mês 30 ou 31 da vírgula anterior. O ano, 12 meses. E aí a coisa complica. 12 meses têm 365 dias, 8.760 horas ou 525.600 minutos. Esqueci-me dos anos bissextos. Infeliz que o inventou. Tempo. Atualmente, contamo-lo a partir do nascimento de Cristo. 2010 anos. O relógio corre. Números.

Não há liberdade, estamos presos nos segundos, nos dias, no dia do vencimento de uma conta. Em chegar antes das 16:00 aos bancos (atenção ao horário de Brasília – DF). Por sinal, gosto muito desse novo medidor de tempo. Finalmente tomaram coragem para atrasar e adiantar os minutos. Números.

Almoço não leva mais que dez minutos. Mastigar pra quê, se no final dos dias não teremos mais dentes, não é? Vamos treinando em engolir sem usá-los apenas empurrando com a língua o bolo de comida junto com refrigerantes que nos envenenam descaradamente dia após dias.

Vamos falar de estatísticas. 380 palavras (e crescendo) com 2162 caracteres com espaços, segundo o Microsoft Word. Falando em caracteres, gostaria de saber por que o miserável criador do Twitter só pensou em 140. Acho que ele não pensou que vivemos com milhares de ideias formigando na mente. Ser jovem não é tão mole assim como parece. Mais de 16 mensagens na rede de microblogs se fariam necessárias para realizar esse texto.

12:33 e cá estou eu falando de números, estatísticas, tempo. Juntando português e matemática. Passando sutilmente por religião só para os fanáticos terem o que comentar. Incrível que só sabem criticar. Acho que se eu lançar uma tag de Jesus Cristo no Twitter agora, uma avalanche de críticas me viriam como resposta.

Não ligo. Em prosa ou poesia, meu maior fanatismo se faz em juntar palavras. Isso me move. Ah, e as estatísticas e os números? Bem, estou caminhando para o quarto ano de blog. É preciso renovar e me desprender um pouco das correntes singelas da fantasia poética. Feliz 2011. Quatro números, um desejo e um escritor sem rumo. De novo. Ano novo.

Domador de leões

Cansei de fazer poesia. Calma, isso não é música do Charlie Brown Jr, embora eu queira mandar muita gente se foder. Bom, posso estar sendo agressivo demais. Talvez a poesia não tenha culpa disso. Desculpe, não cansei de fazer poesia, mas é preciso mudar um pouco.

Vamos enfim enfrentar novos rumos, fugir daquilo que já está vencido. Como um jogo já “zerado”, daquele Marios Worlds da vida que você já sabe todos os caminhos possíveis e imagináveis, os atalhos, as manhas, os macetes. Cansei de pegar moedinhas douradas por algo que já decorei a forma exata e suficientemente satisfatória de criar.

Vou me perder em meus pensamentos assim que eles visitarem minha mente. Hoje, por exemplo, tenho me sentido extremamente fora de contexto com aquilo que há algum tempo me transmitia a mais profunda e real convicção de que não estou sem apoio. Sei lá, aconteceu assim mesmo, do nada. Como acordar de manhã com vontade comer cereais em vez do pão com manteiga tradicional.

Vou me aventurar no que não conheço, permitindo-me escrever em parágrafos desconexos, talvez sem a devida pontuação adequada, sem ritmo, sem o tom maestro que te levaria a ler gostosamente até o final.Não importa. Quero gritar, gritar e gritar, apenas passando minha ira do coração aos poros da pele.

Cansei do politicamente correto, das palavras bem pensadas, das declarações de amor que lanço ao vento. Descobri que as palavras podem ser pesadas e ásperas, também gostosas de serem expulsas. Por fim, cansei de me domar e de me autodominar.

Libertem os leões, eles por si são livres. Não adianta mais me ameaçar com chibatas sociais. Serei o rei da selva novamente. Meu coração já não é mais um jardim florido e de passarinhos que cantam ao nascer do sol. Quero a escuridão e as corujas sonambulas.

Fumaças

– Fogo?
– Tenho, senta aí.
– Fuma há muito tempo?
– Comecei essa semana – desdém e sorriso amarelo.
– Dores do amor?
– Talvez – uma tragada
– Tem nome?
– Tinha, quero esquecer – fumaça
– É por isso que fuma, não é?
– Cigarro mata o cérebro. Não é isso que dizem? – outra tragada sem jeito.
– Eu fumo há trinta anos.
– E aí?
– Ah, o amor! – gargalhadas – trinta anos, cara! TRINTA!
– E o resultado?
Uma tragada profunda e a resposta:
– Ainda sei o nome dela, mora com outro. Teve dois filhos, sabe. Engordou alguns quilos. Usa vestidos estampados, acredita? Ah, e isso aqui – mais uma tragada – foi a única coisa que me sobrou dela. Nós fumavámos há trinta anos. Ela parou, mas há trinta anos não me esqueço dela…

O colecionador e o conto do beijo

“O amor dá-se de duas formas: Quando você espera e quando você não espera…”

É engraçado… Às vezes me pego sorrindo sozinho ao volante. 40 km/h em uma estrada. São meus pensamentos que resolveram ultrapassar a velocidade máxima da via… Engraçado, quando eu te via. Você não sabia que eu lhe observava.

Discrição total de colecionador-contemplador de uma beleza que só nos é revelada com cautela. Você sentado num banco da escola com uma menina. A beijava deliciadamente, gostasa e um tanto timidamente. Vejo que suas bocas não se encontravam. Suas línguas não compareciam, seus lábios não se encaixavam. Era uma desarmonia de principiante. Mesmo assim se despediram felizes.

Cinco dias depois eu decidi, já desesperado com sua postura de esperá-la todos os dias que se seguiram ao primeiro contato, disser-lhe que ela não viria mais. Sentei-me ao teu lado sem dizer uma palavra sequer. Enfim você suspirou e desabafou: – Por que ela não vem mais? – Ela está tão perdida quanto ti.

Bastou para que ele se encontrasse antes de voltar àquele banco…. E quando por fim se achou, lá estava ela.

Hoje eu dirijo a 40 km/h sorrindo para o amor.

Paciência de colecionador

“Ser colecionador de histórias é um plano traçado tão minuciosamente que qualquer palavra pode colocar tudo a perder em cada etapa da operação”

Pessoas precisam se sentirem amadas, se você for capaz de amá-las será o melhor colecionador de histórias da sua região. Ao dar a sensação ao seu autor-instante de que ele é fundamental em sua vida e mais, que ouvi-lo é essencial para ele e para você, terá boa parte dos seus primeiros capítulos a colecionar.

Deixe-o seguro e confortável em sua presença, não o interrompa enquanto ele desabafa e tente entede-lo quando parar. A melhor rede de um colecionador é fazer a sua caça acreditar que você vive da melhor forma possível, entende o mundo dele de forma tão segura e espontanea que parece ser você uma cópia dele, uma imagem-espelho.

Uma vez que assim ele se sinta, chega a hora de mostrar que você também confia nele. Mostre alguns de seus pontos fracos e peça auxílio. Se ele realmente mordeu a isca anteriormente sentirá-se praticamente na obrigação de ajudá-lo.

Chegando no estágio de crença mútua poderá fazer-lhe qualquer pergunta sem medo, criticá-lo, ameaça-lo, seduzi-lo ou dizer-lhe o que lhe der vontade que será ouvido.

Eu adoro a confiança que depositam em mim.

O colecionador de histórias

A vida de algumas pessoas das quais eu tenho conhecimento dariam boas histórias, se publicadas. Não por motivos comercias, até porque para uso comercial seria muito simples fazer-se interessar por uma história. As pessoas são curiosas por natureza, e se a venda fosse o alvo de colecionar histórias, eu poderia facilmente brincar com essa arma de consumo tão natural que eu não seria acusado de nada. Mas dinheiro não é a minha prioridade em obter histórias das pessoas. Não quero vender a vida delas a ninguém, mas sei saborear bem as suas revelações.

Essas vidas formam um bom livro que me distrai sem que eu mesmo perceba, e quando paro para encarar os fatos já li bastante sobre elas, até mais do que elas já ousaram contar a alguém realmente. Mas nada disso é intencional, e por isso não me há culpa ou remorso.

Eu não leio páginas quando o livro quer ficar na sessão restrita. Mas em todos os casos de que me disponho a ler, as páginas viram sozinhas sob meus olhos; e movido pela curiosidade as leio, e me envolvo como bom leitor.

Uma vez passados os primeiros capítulos, envolvo-me a tal ponto que me torno parte da história contada por cada um. Embora em livros normais eu tenha que esperar a vontade de seu autor em me revelar os fatos e desdobrar seus mistérios, nas minhas coleções de contos pessoais posso seduzir o autor-instante a me desdobrar sua vida com tamanha liberdade que me surpreendo.

Vejo-me não em uma cronologia de enredo, mas em mundo embaralhado em que não obedece nenhuma ordem de pensamento. Para os autores de minhas coleções pessoais, os fatos que ocorreram há 10 ou 15 anos – talvez nos dias em que ela se entendeu por gente – serão interligados no hoje e até no futuro próximo que ela espera que ocorra.

Gosto dessa maneira de ler livros – e da forma inovadora em que eles se apresentam – porque não sei o que virá em seguida e não tenho nenhuma pista sequer para montar em minha mente um tipo de desfecho – se é que possui um. Não tenho as suas feições cara a cara para saber como ela demonstra que está ao me segredar pontos que não ousaria dizer nem a si mesma, mas que acaba apoiando-se em mim para assim fazer. Talvez a forma misteriosa é que as faça revelar-se tão rápida e abertamente.

Eu adoro colecionar histórias de vida.

A empresa

Mordiscou os lábios. 12:30. Quarenta minutos de atraso, inadimissíveis quarenta minutos. – Transito desgraçado. Um passo a cada três minutos.

– Eu lamento Jorge, mas não posso largar o carro no meio do tráfego. Por que não remarca essa reunião?
– Você só pode estar brincando! Sabe quantos milhões estão em jogo com o fim desse encontro?! Não podemos ter nem mais um dia de atraso!
– Que se dane! Vou chegar aí em 15 minutos, podem esperar. – Jogou o aparelho celular para o banco do carona.

Tomou a calçada, não queria saber das consequências. Acelerou, quase bateu em uma árvore, por pouco não atropelou os pedestres. Nada deixaria ela longe da promoção mais significativa da carreira – e já teve muitas etapas importantes na sua vida profissional.

Cinco minutos mais tarde, bem mais cedo do que esperava chegar, estacionou em frente ao monumento de vidro. Antes de sair, pegou seu batom vermelho, retocou as falhas feitas pela ansiedade do trajeto, ajeitou os belos cabelos loiros, e saiu em direção ao último andar.

– Sala da diretoria, por favor. – Mesmo anciosa sua aparencia não denunciava seu estado. Seu sorriso enigmático e a voz macia, conferiam-lhe ar sereno.

– Estou subindo Jorge, mais trinta segundos. Prepare minha cadeira.

Bateu o telefone e olhou-se no espelho do elevador. Consigo mesmo dizia nessa fração de segundos:

– Preparada minha querida?
– Não me resta dúvida da resposta – Disse baixinho.

Caminhou pelo corredor principal com a maleta na mão, com o passo mais firme que nunca. Abriu a porta rapidamente, não olhou para os lados em nenhum momento. Sentou-se na sua cadeira de costume ao lado do presidente da companhia. A vice-presidente, logo confortável em sua cadeira, disse com voz sisuda:

– Perdoem-me a demora, o tráfego estava um inferno. – Não prolongou muito as descupas – Sérgio, quais são as nossas realidades na contabilidade – Apontou a caneta dourada para o colega de equipe um pouco a frente, a sua direita.

Sérgio era experiente: 22 anos de profissão deram a ele visão de futuro, seja em qualquer mercado, estável ou instável. As moedas poderiam estar inseguras, mas ele não:

– Não vou enganar vocês, nossa situação é difícil, a perda de clientela têm nos deixado por baixo.

Viviam pareceu não dar atenção a uma das vozes mais respeitadas da empresa:

– Claudio, qual é a nossa força de trabalho? – Dirigiu-se ao rapaz mais afastado da esquerda.

– 35 mil homens, 15 mil mulheres. 3 unidades, além desta central.

Viviam não pensou muito, pediu para que todos saissem. Deixando ela e Jorge, o presidente, a sós.

– Sabe que sua decisão pode te dar o maior cargo da companhia. Diga-me o que pensa em fazer.

– Passar o pente nos meus cabelos.
– Como? – Jorge não estava impressionado, mas sorriu gostamente.
– A malha fina da companhia. Vamos tirar os gordos que comem rosquinhas de trás de suas cadeiras, tirar seus ar-condicionados e pôr todos ao trabalho. – Jorge levantou a sobrancelha direita – Tem mais, proseguiu a aspirante à presidencia – Cortaremos a força de trabalho masculina pela metade e aumentaremos a força feminina em 45%.
– Tem certeza?
– Ela o encarou seriamente nos olhos – Veja, – Viviam apontou as planilhas de levantamento – as mulheres produzem dois produtos a cada 5 minutos, os homens, levam 7 minutos para produzir o mesmo. Temos perda significativa no final do semestre.
– Certo, vamos testar seu esquema e no próximo bimestre montaremos novo encontro.
– Testar?! Você sabe o quanto suei para chegar neste posto?! Não fosse por um prefixo besta, temos os mesmos cargos. Você não me “testou” em nenhum momento.
– Vamos decidir isso de outra forma então.

Toda aquele stresse incomodou os dois cargos mais importantes de uma empresa com um futuro incerto, mas às portas fechadas, deram vazão ao que desde que se encontraram, como meros empregadinhos da mesma fábrica, desejavam fazer. Elevaram seus lucros, luxúrias e juros sexuais a uma margem de lucro fora de questionamento.

Sétimo andar

Entrou no prédio correndo. Atravessou o hall num piscar de olhos. Pegou o elevador.
– Para qual andar senhora?
– último
– Pois não
Assim que o rapaz virou-se ela foi categórica em lhe dar um beijo. Estavam a sós na cabine. Duas cameras no alto gravavam a cena. Chegou ao destino. Largou do jovem num salto e partiu para aquilo que deveria fazer. Hoje. Agora. Nesse exato momento. No corredor, avistou a sacada.

– Vamos!
– Temos razões para acreditar que ela entrou naquele edifício, vamos depressa!
– Portaria do Edificío salazar, com que morador deseja falar?
– Polícia. Precisamos entrar.
– Um momento. O porteiro olhou para o televisor que gravava as imagens da rua. Dois policiais estavam na porta exibindo suas crendencias oficiais. A porta foi destrava e aberta.
– Uma mulher ruiva, com mais ou menos 1,80 cm entrou a pouco aqui?
– Sim, a senhorita Júlia. Mora no 302.

Os policias foram correndo ao elevador mais próximo.

– Com licença, poderia me informar para que andar a senhorita Júlia do 302 desejou ir a pouco? – Esse foi o nome que ela deu aos funcionários do hotel, pensava o policial.
– Pois não, estranhamente ela foi para o último andar. Ela deveria parar no terceiro, mas não foi o que…
– Precisamos chegar até ela o mais rápido que esse elevador puder subir! AGORA!

Em questão de minutos estavam no andar desejado.

– César, mire os refletores próximo ao sétimo andar. – O colega foi avisado pelo rádio. Se estiver vendo uma pessoa na sacada, não aponte a luz diretamente para ela, entendeu?
– Certo, senhor. – Alguns segundo se passaram e então ele retornou: Sim, parece ser ela.
– Estamos perto dela também, vamos tentar uma abordagem amigável.

– Já devem estar aqui. Não vou perder tempo. Não aceito ser trancafiada, nasci livre e livre serei, nem que for na eternidade. Jogou-se.

– Não foi possível fazer nada, ela se jogou.
– Ela morreu! Tudo muito rápido, não conseguimos salvá-la.

Causa mortis: Suicídio
Motivo: Não declarado
Passagem pela polícia: Assassinato, furto, depredação de patrimonio público, perturbação à ordem e à moral pública, atentado violento ao pudor, abuso sexual, tráfico de drogas, formação de quadrilha, sequestro.

Falta de amor. Não teve vida digna, sem enterro decente. Na eternidade seria mais feliz…

Desenfreada

7:04. Acordou abruptamente. Xingou aos quatro ventos, acordara irritada. Sonhou o que não queria. Fez de tudo para não relembrar disso ao menos dormindo, queria um sono tranquilo e não o teve. Acordou frustrada.

Deu um salto, vestiu-se, pois que era de costume dormir sem amarras. Dizia a si mesma que dormir libertava a alma, e qualquer coisa que a prendesse poderia impedir que viajasse por outros mundos. Sim, queria libertar-se desse mundo, sem loucuras, mas desejava fugir.

Era uma mulher infeliz, de meia idade, esperta e vivida. Meiga, mas séria. Fria, mas encantadora. Ríspida e sedutora. Descrvê-la fisicamente não será necessário, não era espetacular, mas sabia usar suas armas quando queria, e fazia bem feito. Brincava com homens, eram previsiveis e completamente tediantes.

Saiu do quarto, bebeu seu café forte, leu a manchete do jornal local, fumou um, dois cigarros, pegou as chaves do carro e saiu. Não iria ao trabalho hoje. Ver as mesmas caras, as mesmas reclamações, ter os mesmos pedidos.

Decidiu dobrar a esquerda, e não a direita. Gostava das esquerdas da vida, davam mais graça pra continuar. Nessas esquerdas da vida, um dia, tinha se perdido, gostou de se perder. Nunca mais foi a mesma.

Fumou mais um cigarro, colocou a cabeça para fora da janela, xingou um motorista e jogou o cigarro fora. Queria ir em alta velocidade para uma vida mais dinamica, onde gostava de não dar as cartas. Toda pessoa gosta de ser guiada sem saber o próprio rumo. Ela sentia falta disso…

Um amor sem nome

Saíra de casa com um vestido lindo de quadrilha, apesar de já velho, algumas modificações foram feitas para este ano. Nada que não o identificasse como o mesmo vestido do ano anterior, mas alguns acessórios e mais brilho já lhe dava outro aspecto.

A amiga ligara mais cedo naquele mesmo dia convidando a jovem moça para uma festa a ser realizada em um sítio. Não havia programado nada para esta sexta-feira, ficou em casa descansando da árdua semana que teve. Não achou problema algum em sair num domingo à noite para um pouco de lazer e aceitou o convite, assim começaria animadamente a semana.

Poucas horas depois a amiga estava em frente à casa, esperando-a no carro. A jovem demora um momento, mas logo embarca no veículo. Sorridente faz todo o percurso entre risos e conversas com a amiga.

Dez minutos ou menos foram suficientes para chegar ao local, tipicamente enfeitado com bandeirinhas e barracas que ofereciam prêmios para os jogos normais daquele tipo de festa.

Desembarcou. Pessoas rindo e querendo formar fila para as brincadeiras passavam de um lado para outro. A amiga conhecia aquele lugar. Era o sítio dos tios. Logo chegara já foi abordada por um rapaz.

Era forte, com belos olhos que a jovem moça não conseguia desviar a atenção. Ficou parada por alguns segundos. Sequer percebera o cumprimento do rapaz. Quando voltou a si já estava dançando com ele. O momento era tão mágico que tudo o que fazia era praticamente automático. Ficara realmente admirada com aquele homem. As horas voaram enquanto ela estava em transe.

Somente uma freada brusca do carro a fez voltar a realidade. Estava retornando para casa.

Entrou sem falar nada com a mãe que estava na sala a sua espera. Subiu para o seu quarto praticamente num ato involuntário. Abriu a porta, viu a cama arrumada que a esperava. Decidiu tomar um banho antes para tirar o suor de algumas horas de dança, não sabia quantas exatamente eram.

Ao tirar o vestido percebeu o cheiro de capim que impregnou o leve tecido. Reconheceu o aroma rapidamente, sem dúvida, era dele. Por um bom momento cheirou seu vestido.

Sentiu um frio na barriga, seu estômago revirava. Nunca sentira isso na vida. Não sabia ao certo se era paixão, não a sentira ainda. Era jovem, imatura. Seu coração palpitava, acelerava, parecia parar bruscamente. Começou à chorar por saber que não o encontraria mais. Por mais incrível que pudesse parecer as lágrimas que corriam pela sua face, molhando o vestido, não eram ácidas e sim doces lágrimas de paixão.

Foi imediatamente à banheira, aquele homem a deixara atordoada, não sabia o que faria, muito menos o que passava pelo seu coração. Entrou na água morna, por quase uma hora mergulhou em pensamentos vazios movida por uma paixão louca. Era impossível que isso estivesse acontecendo… Apenas um contato, oi, uma dança lenta, nada mais.

Até seu nome esquecera de perguntar. Como poderia ter esquecido, idiota! Ficou encantadíssima com tamanha beleza que… Esqueça isso tola, nunca mais o verá!

Só sobrou a roupa, um simples vestido de quadrilha com o cheiro inconfundível de campo e suor do primeiro homem pelo qual se apaixonara.

O jogo

O jogo

Prólogo

César é um jovem viciado em drogas que mente e manipula todos à sua volta para conseguir saciar seu vício. Mas as coisas nem sempre saem como ele planeja e o jogo fica difícil pro seu lado.

Ameaçado pela dívida que conseguira, não deseja envolver sua família nesse mundo tão sombrio e astuto: Precisava pensar, resolver as coisas do seu jeito sem que ninguém soubesse, mas muitos sabiam de seus planos e o olhavam de longe.

Para não perturbar a pouca paz que a mãe tinha, resolveu mentir, dizendo-lhe que arrumara um emprego na indústria de software. Dona Marta, sua mãe, sente-se feliz que o filho tenha tomado um rumo na vida e não percebe sua verdadeira intenção.  Mulher zelosa com os afazeres domésticos e com a família obrigou o filho que terminasse seus estudos, impondo-lhe a condição de que se assim fizesse, poderia decidir o que fazer da própria vida. César não teve outra alternativa a não ser concordar.

Assim feito, já não lhe agradando os livros e desejoso da vida fácil, rumou para o mundo sem volta, da qual ele conhecia os riscos, mas, enquanto tivesse dinheiro sem o menor esforço estava disposto a correr o risco. Afundo-se de vez nessa vida e a cada dia que passava estava mais preso a ela, dependente da paciência dos amigos que aguardavam o pagamento dos seus empréstimos, cada vez maiores, e eles, com menos vontade de aguardar.

A coisa piorou e César entrou em desespero. O serviço que dissera para mãe era seu último golpe de sorte: A verdadeira roleta-russa da vida de qualquer traficante. Seus contrabandos eram sua última esperança. Aproveitou-se do conhecimento de sua faculdade na área da tecnologia para enganar quem o pudesse deter.  Vendo que mesmo assim foi encurralado e não tendo mais saída, qualquer um que o stressasse estava marcado. Cumpriria seu contrato dando fim a duas pessoas da mais conceituada universidade da cidade, e assim cometeria suicídio, já que os negócios não lhe rendiam.

Mas, alguns anos depois, a história tomou outro rumo, em uma emocionante história que irá lhe envolver como nunca!

Capítulo Um

Em uma das universidades mais concorridas do país, César passou por uma seleção difícil.

Especialista em desenvolvimento de software, ele já tem seu emprego garantido e só decide passar pela faculdade de novo porque deseja se atualizar.

Decide vadiar em outras aulas que ele sempre gostou e vai parar em uma de história que nem queria participar, mas, como não pode ficar pelos corredores, entra na sala, e se senta na primeira carteira que vê.

A sala está lotada, o professor anda de um lado para o outro explicando o que ocasionou a guerra fria.

César entra, pede licença e vai se sentar rapidamente.

Nos fundos da sala, na sétima e última fileira a contar da porta para a janela, ele senta. Abre um caderno pequeno já com bastante coisa escrita e começa a fazer rabiscos ao invés de escrever o que estava no quadro.

Entre um código e outro, César olha a sua volta e pra frente para não ser inconveniente. O professor percebe e pára um segundo, olhando fixamente o garoto. César depois de desviar o olhar e voltar ao caderno percebe que o professor retoma seus pensamentos e segue com a aula.

César não percebe que a aula acabou e quando nota já há poucos alunos na sala. Ele fecha o caderno e segue até a porta.

Quando chega próximo à mesa do professor é interrompido e questionado por Augusto:

– Por que estava fazendo algo que não era da aula, não notou meu olhar para que acompanhasse o que eu dizia?

– Sim, notei. Não me importo. Depois recupero essa matéria, mentiu.

E assim deixa o local, agora só com o professor que arrumava seus papéis.

Em casa César liga o computador e abre programas complexos para uma pessoa operar sem conhecimento técnico.

Nos campos em branco na tela ele insere vários códigos e realiza comandos rápidos. O personagem no monitor se move, e César deixa transparecer certa felicidade num sorriso amarelo que logo deixa seu rosto.

A mãe grita para que o rapaz desça pois o almoço já está pronto. César desce as escadas, coloca pouca comida no prato e nem dá atenção às reclamações de Marta.

Depois de comer César volta à aparelhagem do game e faz novas tentativas. Após horas revendo os erros ele decide parar por hoje.

Assim que deita na cama ele pensa sobre seu projeto, um jogo de tiro anarquista, mas sabe que ainda tem muito que fazer…

Depois de alguns meses desenvolvendo, reparando falhas e aprimorar muito o game, César decide que está na hora de lançar uma versão beta do produto e assim ter opiniões para melhorá-lo.

César faz então um DVD com o arquivo do jogo, desliga o computador central e o maquinário decidido a entregar o jogo a um amigo.

Então ele vai à casa de Renato, um visinho próximo e entrega a cópia, pedindo que o garoto teste seu jogo. Diz que volta em três dias para saber o que o amigo achou.

A mãe entra no quarto do filho e assustada com a situação que vê, pergunta:

– O que são todos esses mapas e cadernos?

– Nada, coisa do trabalho.

– Sei…

– Como é esse novo projeto?

– É um jogo de tiro, por isso estou cursando a faculdade de novo. Preciso estar lá vendo como é o ambiente porque o cenário do jogo é baseado em um campus de universidade.

– Precisava se matricular?

– A empresa não quer que esse projeto vaze, precisava entrar lá sem levantar suspeitas, por isso eles pagam as mensalidades.

– Seu pai ligou. Disse que não vem pro jantar. Vai fazer o teste pra subir de nível na polícia hoje.

O plano já estava todo arquitetado. Renato entregou o DVD dizendo que o jogo estava bom, que por se passar em uma universidade cheia de alunos, e o fato de ter que matar alguns para completar missões, deixava o jogo mais divertido.

Só falta meu pai passar, pensava o garoto…

Pedro chega com a boa notícia, radiante por ter passado para atirador de elite, e leva a família para jantar fora.

Cansei de esperar, já fiz todo o percurso virtual, agora é com a cara e coragem!

E nessa determinação César vagarosamente vai ao quarto dois pais. Em cima do guarda-roupa encontrava-se a arma de serviço que o pai acabara de receber da corporação.

– Dona Marta, o César está?

– Não Renato. Trabalhar sei que não foi porque me disse hoje cedo que iria resolver uns problemas… Desde então não o vejo.

– Sabe onde ele pode ter ido?

– Não… Ele só disse que iria deixar a faculdade hoje.

– Tudo bem então, obrigado.

Renato sai da casa e entra em desespero:

– Tenho que correr, se ele foi mesmo para a faculdade vai acontecer uma tragédia imensa!

Com uniforme da instituição César passa pela segurança do portão sem problema, ninguém percebe a arma escondida em baixo da sua camisa.

Ele sabe que pra cancelar a matrícula deveria ir ao segundo andar, mas fica no térreo mesmo e vai ao banheiro.

Como arquitetado, às 14:00 não havia ninguém usando o local. Ele então vai até o Box 4 e abre a passagem secreta.

Dento de um túnel ele veste sua roupa e luvas pretas.

César ao entrar na sala percebe o diretor sozinho em meio a papéis e mais papéis.

Rende o homem e coloca a arma na nuca, um disparo já é o suficiente. Nenhuma voz no lugar se ouve depois disso.

Como planejado ninguém sequer ouviu o tiro porque as salas estavam três andares a cima e César voltou ao túnel, pegou seu material e foi assistir normalmente às aulas do dia.

Renato invade a instituição com um grupo de policias e é barrado pela segurança.

César espera que todos na sala saiam e pede para Augusto ficar porque precisa falar algo sobre a aula de hoje.

Sem ninguém no local ouvem-se dois disparos.

Renato mostra a identificação de policial federal e entra com o resto da tropa na universidade.

Alunos avisam ao policial que dois tiros foram ouvidos nos andares seguintes.

Sem esperar mais nem uma palavra, a tropa corre e chega ao local do crime.

Assim que entram na sala os policiais dão voz de prisão a César que já estava abrindo um alçapão para escapar.

Espantado com a situação ele se dirige a Renato:

– O que é isso?

– Eu que pergunto… Você acabou de matar esse homem, não foi?

– Como sabia?

– Eu sei de todo o seu plano. Fiz uma cópia extra daquele DVD que você me deu. Os erros do jogo, que você disse que poderiam ocorrer por ser uma versão beta, eram na verdade dados criptografados que atrapalhavam o jogo.

Nosso serviço de inteligência fez o resto.

Sabemos que você é usuário de drogas e está matando essas pessoas como pagamento.

Agora é melhor se render…

– Agora que já paguei o que devia não vou pra cadeia… Só queria pagar para eles não perturbarem minha família.

Já que está tudo certo…

– Seu filho se matou senhora. E a arma do seu marido está conosco. Só viemos comunicá-lo que ele será afastado da corporação pela falta de cuidado com a arma.

Seu filho era usuário de drogas, encontramos com ele os cadernos com os nomes das vítimas e quem mandou executá-las e faremos uma investigação.

Não sou amigo do seu filho. Era um disfarce. A polícia federal vem investigando os movimentos do criminoso desde que vocês se mudaram. Sabemos que ele fugiu da outra cidade porque devia dinheiro aos chefes daquela área.

Descobrimos que a empresa que ele dizia trabalhar era apenas uma maneira de despistar a atenção da polícia.

Já que ele se matou vamos fazer investigações com o que ele nos forneceu e assim solucionaremos o caso.

Capítulo Dois

Parei imediatamente. Cansei daquela história, falar dos problemas da sociedade moderna que trouxe facilidade para o domínio das drogas mais rapidamente, usufruindo das mais altas tecnologias que levaram anos para que desenvolvessem com objetivo de ajudar a melhorar a vida das pessoas, mas que tinha também seus efeitos colaterais.

Cansei definitivamente de tentar rabiscar meu nome na história desesperadamente através de um livro. Não que eu não queira palavras minhas em papel de seda com letras grandes, numa capa flexível recheada de páginas que detalhadamente desdobra algo a ser apreciado até pelos críticos. Mas eu não queria que tais palavras fossem da realidade atual. De uma realidade que todos estavam cansados de saber, de ler nas bancas dos jornais todos os dias e de ver quando ligam seus aparelhos que com o suor do trabalho pagaram. Realidade assombrosa, medonha, por vezes, inacreditável pelos requintes de barbaridade. Não, não era isso que eu queria. Só porque esse assunto, apesar de surrado, vendia, apesar de decorado ainda despertava curiosidade. Curiosidade essa agora, não para saber o que aconteceu ou com quem, mas como ocorreu, o que usaram e como usaram. Apenas um velho, mas um pouco recente, hábito da sociedade.

Gostaria de saber por que de ter que de descrever com capricho e enfeite nas palavras o que todo mundo já sabe, só para ter um nome nas listas dos livros mais vendidos. Queria saber por que tinha que seguir o jogo, o verdadeiro jogo. Não estava com vontade de escrever sobre um traficante de drogas que se apaixona pela filha do policial que o prendeu, mas o jogo da sociedade que ditou as regras de quando, como eu deveria escrever, e o que deveria contar para ser aceito. Não era bem isso que eu queria. Estava cansado de ter que seguir regras literárias. Já não era o primeiro livro que tentava escrever e até rezava para ser aceito. Definitivamente escrever do jeito que gostavam era impossível pra mim. Chegava a me perguntar se aquele lixo que sujava as mentes das crianças ainda pequenas que não sabiam nem ler ou escrever merecia as páginas de seda.  Cheguei à conclusão que não.

Fiz uma pausa naquele conto. Se o joguei fora a resposta é não. Naquele tempo pensava que fosse um lixo, mas a história implora por pergaminhos velhos que fale qual era a realidade de tempos atrás.  Eu continue, reciclei aquele lixo, mas nunca tive coragem de colocar aquilo em papel de seda, ele morreu mesmo na gaveta com um fim, sem dúvida que teve. Mas mesmo depois de tanto tempo o assunto não saia das páginas pretas e brancas dos jornais pelo mundo afora, e eu não vi graça nenhuma em jogar a mesma matéria, com palavras mais pomposas, nas páginas coloridas e delicadas de um livro. Nunca fui um grande escritor nomeado por belos e reveladores escritos. Devo apenas ter sido o primeiro a não ter me rendido ao verdadeiro jogo pelo dinheiro. Se após a minha morte aquele lixo teve valor já não garanto, mas em vida não passou de um simples conto…

Preparando a cirurgia

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Tem dois dias que você não dorme
acha que resiste até quando?
Não importa onde você se entregue,
no sofá, na cama ou em pé.

O que mais me cobiça é entrar na sua mente,
deixar você pensando que não vale nada…
Entro aqui pra embaralhar suas idéias
e já te deixei tão vulnerável
que até fora dos sonhos eu tenho acesso aos seus medos.

Não sei quanto tempo você vai levar
mas essa espera me deixa louco e,
tenha certeza, na primeira oportunidade
eu não vou ter pena.

Pelo contrário, vou esfarelar sua alma,
deixar em cacos seu coração e no lugar dele
virá uma pedra dura, negra e que não
bombeará mais seu sangue.

Como vou fazer essa operação
você vai saber quando ficar um pouco mais frágil,
porque só assim é que consigo te anestesiar.

Conto “A Última Vítima”

Leia também

Parte 1 – O aviso
Parte 2 – Meu fantoche
Parte 3 – A porta da tortura
Parte 4 – Meia-noite
Parte 5 – A resistência

A resistência

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Durma… durma… durma…
Você tem que descansar a qualquer momento…
Não adianta brigar com o sono
estarás em minhas mãos mais cedo ou mais tarde.

Não posso mais buscar a minha cama,
se fizer isso ele vai me torturar
não suportarei mais uma batalha…

Não quero reviver meus piores dias
sem poder fazer nada para que isso acabe,
algo que não quero é sofrer de novo tudo que lutei para esquecer.

Deixe pra lá o café, mesmo com ele você ainda terá que me enfrentar.
Não atrase mais as coisas, eu quero brincar com você logo…

Rendá-se de uma vez e me deixe fazer o que gosto de fazer…
Como vai conseguir viver se não tentar repor as energias?

Vou esperar você cair, é só uma questão de tempo,  ele está ao meu favor…

Conto “A Última Vítima”

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Parte 1 – O aviso
Parte 2 – Meu fantoche
Parte 3 – A porta da tortura
Parte 4 – Meia-noite
Parte 6 – Preparando a cirurgia

Meia-Noite

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Acordei. O lenço parecia querer me enforcar.
Quem era ele, como entrou na minha mente
e porque diz coisas tão estranhas?
Não sei.

Tenho a sensação de já ter ouvido
aquela voz antes, mas onde?
Parecia mais fria a cada palavra que ele dizia…

Por que a perseguição justo em sonho?
Tenho medo, muito medo do desconhecido…

O que passa pela minha mente
ele monitora tudo,
todos os meus medos…

Ansiedades e desejos
ele não deixa que sobrevivam.
Não tenho medo da dor
mas isso não dói,
a dor carnal seria melhor.

Não! Deixe-me!
Eu não quero você!

Vejo medo?
Seus olhos parecem dizer isso.
Você sofre quando dorme, não?

Mas não pode deixar de dormir,
e além de não deixar que durma,
bem, eu também não vou querer que acorde…
Não enquanto eu roubar toda a sua vontade de sonhar.

Conto “A Última Vítima”

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Parte 1 – O aviso
Parte 2 – Meu fantoche
Parte 3 – A porta da tortura
Parte 5 – A resistência
Parte 6 – Preparando a cirurgia

A porta da tortura

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Porque me persegue?
O que fiz pra que perturbe meu sono?
Não me pergunte nada mais, será pior…

Se ando invadindo os seus sonhos
e perturbando sua luz, porque assim eu quis…
Encontrei em você uma pessoa frágil e propícia
para me apoderar do seu espírito…

Eu vivo disso, deixar você sem auto-estima,
fazer você apodrecer de desespero
e acreditar que não há saída para seu problema…

Encontrei a pessoa certa pra manipular,
pessoa com a alma que desfalece
a cada raiar do dia,
eu não poderia perder essa chance…

Vou fazer você odiar a vida
e amar a doença, pois ela será melhor
do que se eu te curasse.

Acredite, a única cura que eu viria pra você
é sofrer mais um pouco
e eu teria prazer em ser seu médico.

Conto “A Última Vítima”

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Parte 1 – O aviso
Parte 2 – Meu fantoche
Parte 4 – Meia-noite
Parte 5 – A resistência
Parte 6 – Preparando a cirurgia

Meu fantoche

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Você aparenta medo?
Acha que aparenta?
Seu rosto gélido ainda não disse nada.

Quer medo de verdade?
Mostrarei o que é.
Enforcarei sua alma…

Você não sabe o significado de temer,
não ainda…
Tem medo de morrer, não é?
Farei com que goste da morte,
mostrarei que ela será uma mãe pra você
se você estiver ao meu lado.

Zela por sua vida, suponho…
Bem… Ela é minha agora.
Será meu brinquedo novo,
se eu quiser arrancar a cabeça do boneco
e colocar outra no lugar, farei.

Se achar que seu braço não me serve,
quebrarei e no lugar virá metal,
enferrujado, para que sua carne
infecte e todo o seu corpo apodreça
bem lentamente, porque é assim
que desejo a sua morte….

Conto “A Última Vítima”

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Parte 1 – O aviso
Parte 3 – A porta da tortura
Parte 4 – Meia-noite
Parte 5 – A resistência
Parte 6 – Preparando a cirurgia

O aviso

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Eu quero te matar e farei tudo por isso,
não pouparei esforços pra te ver sofrendo
e me vendo, temido.

Vou fazer com que me odeie mesmo não querendo,
farei com que me amaldiçoei mesmo temendo um contra-golpe…
Jogarei você até contra si se assim me agradar.

Não medirei esforços pra ver você sangrar,
e não descansarei enquanto os teus olhos não fechar.
Ordenarei para que o diabo venha te buscar
e assistirei ele, o seu corpo exterminar.

Consumirei a sua vida dia após dia,
farei da agonia o bálsamo do seu pranto
porque dele eu vou querer gostas da sua alma…

Se te odiar parece ser tão óbvio,
não se preocupe porque dele você não morrerá,
farei quem você mais ama desejar te matar

Conto “A Última Vítima”

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Parte 2 – Meu fantoche
Parte 3 – A porta da tortura
Parte 4 – Meia-noite
Parte 5 – A resistência
Parte 6 – Preparando a cirurgia