Pés negros

Que faço eu na jangada do tempo
jogado de um lado pro outro
brincando com os ventos

Que faço eu sapateando
na proa, brincando com as sereias,
com os golfinhos, bebendo água salina

Que faço eu se o azul desse céu
se o céu azul me quis aqui
brindando em alto mar

Que faço eu com as nossas conchas
se as nossas coxas também guardam
o mistério, tesouros, frutos do amar

Que faço se os pés no chão
batem firme a nossa energia
se o nosso som é o do coração
e do suor a nos banhar

Com roupas brancas dançamos
alcançamos o que nós queriámos alcançar

Pulseiras artesanais a balançar
na jangada do amor, celebrando
o que não se sabe, o que não se sabe
o que é que existe, o que é que há

Entre eu e essa energia, essa energia
que vem das ondas, do sal que refresca,
do fundo, no fundo do mar

Apenas a entrega, a oferenda
os pés negros descalços
vão reafirmar o nosso desejo,
a nossa intenção de se entregar

Decepção

A decepção carregue contigo
porque comigo se chama frustração,
Cabe-me apenas as suas expectativas
que não se concretizaram

Cabe-me apenas a sua cobrança
mas eu não sou fiador dos seus sonhos
nem cobrador dos seus atalhos

A você cabe a responsabilidade
pelos seus muitos planos
que não foram colocados em prática

E na prática sou apenas uma ilusão,
sou o fantasma do seu remorso
pelas muitas alegrias que te esperam
e se entristeceram

Não me torne seu heroi
eu não sou nada além
eu não sirvo como exemplo
e exemplo seu, só o espelho

Cabe-me apenas a sombra
carrego comigo apenas o fantasma
das farsas que você queria esconder
debaixo das minhas asas