Multitalentos

É o que se espera
de todo artista
que ele domine o sentido da arte,
que saiba das palavras, das músicas,
das imagens, das obras-primas, das rimas,
cultura esculpida a la carte

Que compreenda a literatura,
a partitura, metades de tudo,
movimento do corpo e da mente,
disposição para a escrita
das várias formas de sentir a realidade

Ah, o artista, multitalentos da expressão humana,
disfarça o que é,
cria a realidade do outro,
causa empatia com a voz e com as mãos,
mimese de outras dimensões,
os traços da criação…

Institucional

Ainda tenho tempo para o poema,
– como se eu precisasse de tempo –
— o poema está em mim, o tempo todo —
para alguns poucos versos nesse final de dia,
movido a aprendizado e imensa alegria do aprender

Não sei você, mas eu sei observar,
tem coisas que eu preciso considerar,
nem sempre eu digo, nem sempre se sabe por mim,
mas, é preciso registrar:

As oportunidades multifacetadas que a vida me concede,
cercado de gente que sabe que sabe,
e sabendo que eu ainda tenho a saber,
não sei você, mas, meu verbo é agradecer

É por isso que eu aproveito, como a academia diz,
para beber de muitas águas, e eu não preciso fazer referência bibliográfica,
eu não preciso citar seus nomes, mas, ainda está em voga:

Seus ensinamentos, no futuro ainda, lá na frente,
me outorga competência, entendi o objeto da ciência da Educação Profissional,
ser aprendiz, ser artífice, ser técnico, ser professor, ser – depois de tudo –
convivência humana, na excepcionalidade que não ressalva,
mas, exalta toda a trajetória, o imenso legado institucional

Tributo às Letras

Rendo-me porque não fui capaz
de vencer as palavras,
nem os versos que me manipulam
feito joguete das emoções humanas
e me afundam na imensidão
de mares egos literários

Estou vencido e humilhado
pelo ato quase espiritual
dos fatos que se escrevem por mim

Fui nocauteado pelo desejo
supremo e incerto da tradução
da sua língua na minha língua,
da sua linguagem pela minha arte,
escrevo a palavra transformação

Condenado ao conformismo
de tentativas lindas
que não bastarão

E peço desculpa,
pela usurpação
da matéria
simbólitica
e operária
da reconstrução dos sintagmas
perdão, poeta, pois não
não é escritor de diversão

Dói também ser imortal
dando às palavras a própria vida,
e que vida seria
se não só do poeta,
é quase um pacto diabólico
de palavras pelas emoções humanas
que nem sempre se pedem permissão…

Habilidade com palavras

Para Ana Poltronieri pelos seus 50 anos de vida – Professora do curso de Licenciatura em Letras/Literaturas do Instituto Federal Fluminense – Entre a pausa do quarto semestre para conclusão de Administração/EaD

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E a gente trocou a sala de aula pelos corredores,
pelas presenças em eventos, pelo olá rapidinho,
trocamos a convivência diária futura
por breves encontros corriqueiros

Um poema aqui, um verso lá
a gente se conhece e se descobre
quase sem se falar

Virtual só pra quem não sente o que a gente compreende:
que o dia a dia é de fato aniversariante porque na etimologia
é o que se repete todos os anos, mas esse dia é diferente pra você…

Entre os riscos e a beleza do cotidiano,
todos nós ficamos, um dia, cansados dos desenganos
e, como saída, o poema: Sempre nos conectando…

Bem-aventurada seja sempre cada nova estrofe, sua quinta.
Felicidade sempre desde o verso zero, ainda virão nove antes de mudar:
Assim a é vida retratada, tão breve, tão ligeira
ainda a ser aproveitada…

Não há de ser mera impressão
se a sua sensibilidade encontrar com a minha
na contramão

Mais perto de uma nova vida do que da morte,
cabe ao poema eternizá-la por pura sorte
porque não traduz nem o mínimo da relação humana…

Pra quem pensava que eu conhecia pouco
pra quem lê e pra quem escreve:
habilidade com palavras, charada:

(Si[lê]n[cio)na]
[ins(e)screve]
(mono)grafia
de inúmeras teses

Acredita em polipoema?

Te amo, acredita?
Se não, pouco importa
O poema é a porta do amor,
mesmo que a campainha toque no truque,
vou abrir e sorrir feliz

Se não for assim, prefiro o exagero
de uma vida sem sentido, mas não,
eu não fui feito para alternativa,
não sei vagar sem poesia, romântico
do primeiro ao último verso
até debaixo para cima

Acima você viu o que ninguém diz,
amo até o seu não-amor, meu amor
porque transformo a dor em paixão
e pelo não, pelo sim, lê um pouco de mim,
diferente: pode ler esse verso de trás pra frente,
uma vez mais descubro outra função para poucas palavras

Te amo, acredita?
Se sim, obrigado pelo poema,
senão, pela poesia.

Tenta não amar?

Lê de qualquer forma,
como você quiser,
partindo de qualquer verso,
é só uma pequena dose de amor

Rabisco de poema

Tudo caminhando e eu sigo me perguntando
se posso invadir a sua vida, conhecê-la mais,
quem sabe, desestruturá-lo, tirar você do eixo

Não sei se eu mexo com seus alicerces,
se a minha manobra pode desmontá-lo,
serei eu o culpado de uma alma que padece?

Serei eu o pretensioso mestre
capaz de ensinar a um aprendiz
tão bem, também, sábio?

Eu causarei esse incômodo?
Serei eu mesmo o vilão que suponho,
capaz de te tirar do conforto aparente?

Temo correr o risco,
de eu ser pra você um risco,
arrisco ou te risco?

Reconhecimento de saberes, competências e sentimentos

Em homenagem à Hélia Coelho de Mello Cunha pelo seu legado pela Educação. Mais do que pelos três períodos durante o curso de Licenciatura em Letras/IF Fluminense pela disciplina de Leitura e Produção Textual I, II e III, mas por toda a trajetória de dedicação, comprometimento e amor que ganha uma nova fase.

(Poema inédito: com subtítulo: Averbação para magistério)

Aí eu fiquei pensando,
depois do anúncio feito,
depois do fato concreto,
já premeditado e dito,
naquilo que foi posto:

Quanta história, meu Deus,
está descansando, desacelerando,
quanta vida, quantas vidas modificadas:
A sua, a minha, gerações abençoadas

Privilégio da sabedoria não apenas transmitida,
mas interiorizada; aquele saber que transpassa
cadernos, frascos de tinta de caneta, celulares…
carbono que roda, pó de giz, quadro branco, vidro;
máquina de escrever, transparência, slide,
aqui, não faço jus nem a mera metade…

Por enquanto, o descompasso da inacreditável
(in)finitude do magistério; egoísmo de saudade…
Daquilo que passamos, histórias para contar;
tempo também que iria vir (talvez virá)

Tempo para julgar não tive
tempo para absorver não tive,
tempo para dizer não tive,
tempo para dimensionar não tive,
nem quero ter tempo para esses serviços

Não averbam no coração
as despedidas inconsoláveis
de um ciclo de artista
e do legado da arte

Nova via de poema
de quem segue o mesmo caminho,
mas não deu conta naqueles versos,
que, para você, vão além da vaidade,
brotando em desalinho

Aprendi, caminhando para a segunda metade:
ante os meus vinte e três poucos anos,
vou continuar venerando quem iniciou nos idos dezesseis
a luta sem pesar de uma paixão

Mestres e doutores, a hierarquia da educação não comporta
o que, afinal de contas, nós dois já sabemos:
Quando o amor pelo humano se agiganta,
eu beijei a sua mão, agradecendo à moda antiga,
aquela que deixou de ser professora para virar amiga,
até depois da aposentadoria,
até depois…

Além do gozo

Hoje descobri que o meu desejo por você
vem de outro canto do meu ser,
não do lado animal que reproduz
orgasmo, líquido espermático,
que frui

Meu prazer constante, a sensação do gozo sem fim,
vai subindo manso e cauteloso, como o desejo pouco
de tocar seu corpo, acariciar o rosto,
descobrir o seu toque e o seu cheiro

A forma como você fica sem graça e vermelho,
o contentamento dos seus pelos fora de controle,
circulação do sangue que não te obedece,
seus olhos fechados fundamentam a tese
da maçã do rosto que, elevada de vergonha,
sabe muito bem compreender a entrega que vence

Sei que o seu personagem não queria
demonstrar a fraqueza que um dia
sua alma desdobrou, eu sei e você sabe,
e confirmo pela arte, o que pela arte você esconde:

Seu desejo viciante pela mesma carne,
pelo que você já conhece no espelho,
mas deseja em outra pessoa, o mesmo jeito
de fazer carinho

E é isso que me sustenta,
não a loucura pelo ato animalesco
que coloca dois corpos em um leito,
mas o afago do apreço
delicadeza do começo
além da carne e do beijo

Boa leitura

Que te falta senão
a despreocupação do livro,
café amargo com história forte

Que te falta, leitora avulsa,
senão o volume dos grossos livros
presos com vinco, senhora
para acabar

Que te falta o descompromisso,
a graça, leveza das interrupções,
faltas na estante que carecem de preenchimento

E ainda assim não completar teu sentido

Sem hora para fechar, tua livraria favorita
recebe hoje qualquer escritor-artista,
e teu objetivo abaixo do braço
não tem obrigação nem prazo para autografar

Boa leitura

Cruz e fixo

Para Luiz Claudio Abreu – Instituto Federal Fluminense – Licenciatura em Letras pelas disciplinas de Trabalho e Educação; Psicologia da Educação e Teorias da Aprendizagem nos três semestres iniciais desta graduação.

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Não quero a palavra
como carícia sutil,
não quero a palavra
como vilã, nem nada
arma do enunciado

Resguardo o princípio do respeito
seu credo, seu batuque, seu apelo,
suas duas mãos juntas, seus lábios
unidos em orações decoradas

Não tenho a verdade isolada,
alicerçada em qualquer único Deus
oriente, ocidente ou medieval,
nem as perguntas filosóficas
que formaram a base da ciência
puderam me responder

Recorro à mitologia
ou às palavras bíblicas?
Elas se equivalem ao desconhecido?

Sou homem esculpindo arte
com base em que tipo de sujeito
de que material é feito meu espelho,
de onde eu me olho, sou perfeito?

Nos mitos, nas cavernas,
nas indagações aristotélicas,
nas águas do rio de Heráclito,
nas ruínas do Egito, hieróglifos,
achados romanos da força,
na Palavra que atravessa os séculos,
antes ou depois de Cristo

Cruz e fixo, dono da verdade?