Estado de graça

A vida que você leva
é leve ou te leva?

É preciso ter prazer quando se vive
seja no trabalho, em casa, na roda de amigos,
viver bem ajuda a encarar os desafios da matéria

E em matéria de desafios fortes,
viver é uma gama de sortes e sortes
quando você se sabe forte e leve

Quando se aceita o caminho que se escolhe,
a gente anda com mais segurança no desconhecido.
Tem sempre a surpresa do caminho a ser vivido,
mas, não cabe pavor ou angústia quando a gente entra na sombra,
no breu da escolha que vai se rompendo nos passos

Viver bem, ainda que nem sempre otimista,
quando a gente entende o motivo da partida,
ajuda a ser luz, mesmo sem ser espiritualista

Quantos são aqueles que mesmo na descrença do divino
sabem, não raras as vezes, honrar as oportunidades da vida?
Valorizam o que têm em vez de ambicionar um pouco mais,
e se caem, não desistem, podem até não tentar de novo;
buscam outra meta mais ajustada ao que podem fazer.

O que fazer quando não se sabe o que fazer?

Parar o passo, agradecer o discernimento,
o pensamento e a reflexão, a primeira atitude da razão.
Se é que a vida não anda nada bem, se está valendo pouca coisa,
não é essa a sua trajetória, volta e se refaz.

Encontre-se e tome para si um outro rumo,
crie o mundo! você é parte dele, não assiste!
Se auto-admite! Ser vivo, vive! Até chegar onde?
No seu estado de graça.

Desconstruindo pessoas

E quando não se dava nada por alguém,
a doação total constrangeu,
e quem disse que o mendigo na rua
é coitado, a compaixão dele cedeu
a partilha do pão de ontem

E quando se achava um ser humano perdido,
perdido foi o ego ferido, quando ferido,
por aquela mão que se estendeu

E quando o cuidado necessário se fez presente,
mas o dinheiro não pôde bancar,
quem nunca foi cogitado se ofereceu sem centavos.

O idoso moribundo ainda pode cuidar das crianças,
a criança frágil e pequena diz verdades escondidas das outras bocas,
o jovem imaturo também ensina que a coragem não se ensina,
quando o sistema sufoca tantas adultos maduros,
o deficiente é servidor público que trabalha e não foge do ponto,
e o ponto final é só um blefe.

A vida nos pede a reincidência das reticências

O Eu que mora em Mim

Eu
sou o cara
da piada pronta
do raciocínio rápido
do humor do improviso
e do ato imprevisto

Eu
sou o cara que não procura,
mas se acha a cena certa,
acerta e vai em frente
com coragem e de peito aberto
aquele que não mente

Eu
sou o cara que observa
sou mera leva daqueles que se importam,
assumo a culpa daquilo não feito,
desse jeito que mata no peito o problema,
o lema da coragem, que dá a cara, as duas faces

Eu
sou a fase que segura a oportunidade,
fruto da confiança na espiritualidade,
aquele que abre caminho, fortalece o próximo
o lógico que encurta o problema,
e resolve

Eu
sou o abraço inesperado,
a outra cara da moeda que vira
no tapa que a vida dá no pulso

Eu
sou o impulso do que será o amanhã,
sou o divã do passado, o silêncio que responde,
sou o bonde esquecido, o mais charmoso coletivo,
não deixou o sorriso antigo ser morto,
o representante dos esquecidos sem voz

Eu
sou aquele que desamarra mais nós
que as orações sem atitude,
o fugitivo das escrituras inúteis,
a ação que desilude e desperta,
a peça que ninguém toca

Eu
sou o medo da mudança,
aquele que toma a frente,
o primeiro dos loucos
que todos depois seguem

Eu
sou a Dimensão que se expande, o big-bang,
aquele que tomou ciência da amplitude de ser
Eu

Última apresentação

Quando eu for embora do espetáculo da vida,
quando fechar a cortina e eu agradecer
quando eu me virar para a coxia,
não deixei a plateia, não deixei a vida

Quando a minha atuação se encerrar,
eu não prometo o bis, nem coisa inédita
de matéria perdida de arquivo,
quando eu terminar o riso,
levantem-se depressa

Não quero homenagem,
nem um livro de memórias,
ora, nem luto
para me manter intacto,
raso e falho,
errei a cena

Não deixa a angústia tomar conta
da bilheteria, fiz tudo que pude
não se ilude, ninguém é totalmente
aclamado pela crítica,
fechem as cortinas

Descortinem a idolatria,
perdi o foco, perdi a marca,
cansei de encenar até a graça,
perdi a direção da luz

Só treva no último palco,
última sessão da carne,
repetida que é
remake da vida trágica,
personagem uma vida mais