Silêncio

Minha palavra não me protege
todo mundo fingiu que não viu,
todo mundo está calado,
nenhuma fala na família,
nenhuma palavra nas escolas,
nenhuma menção no trabalho,
nas redes sociais, nenhum manifesto

Detesto.
O silêncio impune.
Ao menos cinquenta vidas,
humanas, perdidas,
Fobia de homem
fobia de mulher
fobia de amar quem se quer

Silêncio.
Minha palavra não me protege
Poesia de morte de iguais,
de iguais que amam diferente

Um massacre desumano
por ser quem somos
humanos

Fica o manifesto para os homens
civilizados, que usam o lado humano
de respeito ao próximo

Caixões com pano de fundo colorido
hoje, preto e branco.
Não só em Orlando.

Partindo o poema

Tem gente que pergunta
porque eu não escrevo em prosa
se o meu estilo de poema
é quase uma conversa contínua

E eu continuo respondendo
que a escolha não foi minha.
A poesia me domina completamente.

É o meu pensamento que já flui rimando,
na minha fala, se der bobeira,
vai no ritmo do poema
essa cadência melódica
no meio do verso

Eu não me obrigo pela rima
no final de nada, esperada
se acontecer, se rolar
eu não percebi

Eu vivo assim: Deixando a palavra,
levado pelo nada da palavra
sem causa pensada…

É que a prosa tem outros recursos,
tem que amarrar nas linhas,
tem que pontuar as vias,
criando estrada, meio de transporte
corrido para a arte

Na poesia, não
eu me esparramo,
eu me espreguiço,
estou solto e vívido

Na poesia eu amo com mais intensidade,
carrego doce e sutil para a surpresa,
a dor e a delicadeza em seus extremos

Sou enfermo desse momento
de febre poética
e não desejo a cura,
não desejo sobreviver

Deixa eu partir com o poema
que ele está perto do fim
por enquanto…

Turista emocional

Não sei o que está acontecendo comigo. Volto as origens de um blog, diário virtual de um jovem solitário. Tudo bem, não há como retornar plenamente aos moldes desse tipo de página que teve início no começo dos anos 90. Hoje, tudo aqui que parece uma resenha de um adolescente em crise pode ser simplesmente ficção. A juventude anda bem criativa, atualmente.

História inventada ou realidade de fato, não importa. Nem que eu diga usando o pronome “Eu”, estaria falando de mim. Poderia ser o eu-lírico, quem sabe. Enfim, enquanto você fica decifrando se é pessoa ou persona a escrever, vamos aos conflitos emocionais:

Acho que estou muito desanimado hoje, com o coração pesado e cheio de dúvidas. E é tão complicado quando a alma se pergunta… Tão inquietante ficar sem respostas. Em certos momentos tenho a certeza plena de que sou amado, outras nem tanto, e algumas vezes, é absoluta a negativa. Eis o momento em que me encontro. Ou que não me encontro.

Não reconheço mais o zelo, o carinho, a doçura. Não me tem total segurança mais. Meu porto-seguro está sendo trocado pelo caos aéreo de minha mente que insiste em viajar nas nuvens das incertezas. Mesmo que seja me dada toda e qualquer certeza durante muito tempo. Mas o momento que piso em falso é o que mais me abala, aquele que tem mais impacto.

Então há sangue. Porque o simples arranhão na incerteza tem aumentado. As bactérias da insegurança dançam em minha carne. É hora da festa daqueles que tanto me tem invejado. Tudo se abre, e a medida que fico com o peito exposto, sem resposta, a ferida ganha proporções gigantescas.

Choro baixinho. Os sonhos foram ilusão, concluo. Todos eles. Cada plano, cada cena, todos os momentos. Não existem mais os sorrisos das brincadeiras que pensei em fazer, pois sabia que riria; não há mais os lugares que iríamos juntos, nem o mar que pretendia te levar a observar; o sorvete que dividiríamos derreteu; as canções que gritaríamos por tamanha alegria já desafinaram.

Então eu acordo. A ira me domina. O tempo perdido, tantos planos jogados fora, tudo em vão. Já não há choro contido, as lágrimas correm sem barreiras. Meus lábios ganham vermelho-sangue, os olhos, a carne viva. O animal se rebelou, saiu de sua jaula emocional e já não come na mão de turistas. Como você tem sido sempre, em mim, enfim.

Passado, presente, futuro

Não viva do passado sem olhar o presente e nem desejar o futuro. Não esteja no presente sem esquecer-se do tempo que passou, mas não deixe de fazer planos para o amanhã. Pense no amanhã, mas não se esqueça do hoje, tão pouco banalize sua história. Esse é o grande lema do ser humano.

Quando, exatamente, viver passado, presente e futuro. A que horas eu visito o ontem, o hoje e o amanhã. Não é tão simples como tomar café da manhã, almoçar e jantar. Seria muito mais simples se achassem o ponto que separam esses três momentos. Não são estações do ano infelizmente. A única parada que nos resta da viagem da vida é uma decisão. Desço para visitar minhas aparentes-parentes-lembranças, construo mais trilhos para ir a diante, ou penso já em outro veículo de transporte.

Equilíbrio. O que sou, depende do que fui, e só fui porque pensei em ser, e só serei construindo o meu ser que já se transformou. Ligação. Pensamento. O fato, na verdade, é que só nos damos conta destes três instantes quando não vivemos nenhum deles. Quando paramos para construir a faixa que separa cada um dos três tempos.

Passado. Perfeito pefeito, imperfeito ou mais-que-perfeito. Só há estas denominações porque foi preciso viver para conjugá-los de maneira adjetiva. Presente. Não se sabe, só se vive; não tem ramificações, apenas estar aqui, escrevendo, sendo, agindo. Futuro. Do pretérito ou do presente. É futuro afinal. Só se pode mencionar o que já se foi, ou o desejo daquilo que se vive. É com base nos dois outros modos que se determina se faremos um futuro com consequências do passado ou do presente. Mas é o único tempo, no entanto, que pode transformar os anteriores.

Enfim, cabe apenas a imatura conclusão daquele que não sabe o que o futuro leitor concluirá por si mesmo: Em que momento fazer do clichê humano algo que já não se deve mais observar? Qual instante determina que se deva pensar ao assunto? E em qual, por fim, momento deixar estas indagações mais adiante?

Ora, se eu soubesse a resposta, não valeria de nada meu passado; porque dele já teria me desprendido. De nada valeria meu presente se já soubesse de antemão os rumos da minha vida. E o futuro seria esperado sem a menor das emoções…