Fomos embora

(Para Adriel Mocellin)

Disponível fora da sua vida
irrelevante na medida certa,
depois de tantos anos dedicados,
a liberdade virou a página

Já não há mais sentido a nossa companhia,
não compartilhamos mais objetivos, nem sensações,
os quais nem sabemos se temos separadamente,
talvez perdidos em nossas individualidades

Partimos cada qual ao seu ponto
separamo-nos de nós mesmos
e não mais nos reconhecemos

Não estamos mais unidos por nada
ainda que nos reste carinho,
nem sei se um pelo outro,
ou pela nostalgia do que um dia fomos

Fomos, embora,
embora não adimitamos
nós fomos, e não, talvez não consigamos
voltar mais

Por escolha

Obrigado por experienciar a vida
na plenitude de quem gosta de viver,
de quem percebe a energia que comanda a existência
não obrigado,
por escolha

Pela força do movimento do espírito
pela matéria que rege o início de tudo
pelos desafios solicitados e colocados
diante daquele que tem prazer em viver

Vida nos olhos,
vida na alma,
vida passada,
vida presente vivida
no futuro que caminha dentro de mim

Todos os traumas passados,
todas as agonias vividas,
todas as causas anteriores
não impuseram tristeza de ser

Não manipula o ego
passível só de si,
daquilo que circunscreve as idas e vindas
sem desculpas

Encara tudo que veio de brinde,
e aceita: a vida permite a resposta,
autoriza a busca da solução para tudo que aflige,
assiste o próximo de todas as formas

Evapora todas as dores do caminho
recolhe remorso, ressentimento,
não é mais a trajetória do progresso
o momento de sofrer

Não se trata de autoestima pela positividade,
esse poema transcende recados
(conectados à compreensão da paz)
parou de fazer perguntas, apenas escuta,
não procura respostas, cria-as.

Estado de epifania

(Para Cadu, pela suas lives tão alegres, por uma amizade leve, por um ano novo especial)


Tenho pressa de viver
de realizar projetos
de cuidar de mim
de progredir na vida
e melhorar a realidade

Tenho pressa de cuidar de você
de te levar alegria, e fazer sorrir
como se só me restasse empatia
para te citar em poesia e colocar
em meus versos rápidos o que de fato
a descoberta por si só não me sacia

Você é fantástico em todas as melodias
e sem saber que é, já tem sido a minha companhia

Quando dança por nós,
e se dispõe diante da vida
a depor sobre o pôr do sol
calando todos os girassóis
na madrugada melancolia

Nem todas as coreografias
ensinam os passos a serem feitos
onde o ser perfeito não ensaiaria

Porque a nota máxima
está na vida, em ser refeito
cada ato como se fosse o primeiro
estado de epifania

Revogada

Não me coloque à prova
para o espetáculo
não mereço aplausos
nem sou digno de vaias

Não me desafie em tudo
não preciso comprovar nada
nem te atestar qualquer mérito
minha vida não vai ser calculada

Por nenhum erro me culpo,
por mim, até me retrato
não para me ver validado
porque há muito
aprendi a ser eu de fato

Não que meu ego domine
ou não mereça críticas,
elas são até desejadas
porque aprendi, sobretudo,
por elas evoluir
deixar marcas

Erro sim, é verdade,
não admito, com tudo, ser condenada
por falhas humanas abstratas

A minha trajetória, por fim,
autoriza apenas o eu
como sujeito da caminhada

Aprendi a corrigir sem ser avisada
e, no que eu puder resumir, serei retificada
e se não quiser assim,
ao que pensas de mim
serei sempre revogada

Sê eu

Onde buscar poesia
nessa vida atribuída
atribulada
atrapalhada

Em dias de chuva
sem a florada das flores
sem o orvalho que ressignifica

Livre-arbítrio
preso em
compromissos
de receitas
de remédios
não tomados
de diagnósticos
infundados
infecundos
infrutíferos

Em busca do que é belo
para justificar mais um
dia sem gosto, insosso
feito sopa sem tempero
sem vontade de cozinhar
ou de coser para pensar
em tempo a perder

Compartilhar a vida
em traços de compartimentos
sem buscar lamentos
para os elementos distintos
de várias personas do eu

Por onde anda os meus desejos
que já não se vocalizam mais
em minhas palavras
escritas ou faladas

Muita coisa já não passa mais
pelas minhas mãos, não produzem mais sons
O verbo transmitir – direto –
já não diz mais nada

Fragmentos de paz e de silêncio
evitando aborrecimentos
emburrecimentos
emudecimentos de reflexão

Flexões do tempo
que sabe passar
sem instrumentos
em amadurecimentos
ao longo dos meus
seres meus
em um só

Pra me redimir

Pra me redimir
peço desculpas previamente

Com o passar dos anos,
abro mão de certas certezas,
Incomodo as minhas incomodações d’alma

Pra me redimir
abaixo o meu ego, reitero
que a vida é curta e o que fica são as relações completas

Quero ir embora com saldos quitados,
com conversas concluídas,
com o espírito descansado da matéria
da vida

Pra me redimir e desfazer desembaraços,
(não se trata de quem quer que seja)
estamos acima das situações e dos contextos

Pra me redimir
não quero pretextos nem definições,
nem respostas de aceites de pedidos de desculpas

Não se trata de carregar culpas pelos aprendizados da vida

Pra me redimir
não busco saídas elegantes,
nem criatividade incentivada
para contornar as iras que causei

Eu sei que pra me redimir
não devo pensar em mim
nem na outra parte como quem ganha um jogo

Pra me redimir
abro o desejo da vida
de seguir seu fluxo
de ser em um só momento
o tempo que sempre irá passar, (por nós)
e mostrar que somos
a própria redenção
do ponto final em reticências…

Democracia estrangulada

Saindo de fininho
com receio de contato,
com cansaço de dizer o mínimo,
de falar o básico,
de explicar projetos de poder,
e das cartadas da mentira,
e do malabarismo com a informação…

Cansado de ver o povo em pesquisa de opinião
sem fundamento, e de questionamentos vazios
e o Brasil sem direção

Cansado de dizer das armações para a mídia
e da milícia da desinformação,
cansado de mentiras e de colocar no outro
as suas verdadeiras intenções…

Saudade do tempo que o Brasil pensava pra frente
e que se era discutido até a privatização
com democracia e com argumento,
sem fanatismo e sem envolver religião

Saudade do Estado laico
e do contraponto,
não essa contradição

Saudade de governo que tinha oposição,
e não opositores em cada agressão
à democracia, ao Direito, ao orçamento público,
às políticas públicas que não transferiram apenas renda,

Saudade de um projeto de política pública de inclusão
do pobre até a dignidade da comida na mesa,
do acesso à Educação, da vacina no braço
e da Constituição

Saudade de um País respeitado como Nação
que tinha voz no mundo, diálogo
e tratava bem sua população

Que desse o mínimo, é verdade, do necessário
que tinha compaixão, que não era um mártir,
nem um iluminado, ou qualquer coisa que o valha,
e não dividida religião

Saudade da civilização,
sem ódio, sem arma como solução

Faz falta é criança na escola,
jovem querendo outra visão de mundo,
mulher escolhendo a profissão que deseja
sem estar com o destino preso e sem direito,
sendo empregada doméstica por falta de opção

Não digo que o mundo era perfeito,
nem tão pouco que não havia coisa errada,
mas, não havia medo em cada calçada,
jornalismo era crível no livre exercício de imprensa

Saudade de um mundo que pensa sem medo
e do cansaço do zelo de levar comida pra casa
Saudade de uma vida em conjunto, e não separada
de gente que somava sonhos, e não críticas e ódios
com ensaios de facadas, de trocas de comandos,
de interferências generalizadas

Não tem literatura que aguente tanta moralidade torta,
tanta perversidade em nome de Deus, tanto alarde com pautas
que não levam nada a coisa alguma, tanta malandragem…

Não aguento mais desmentir alucinações,
e delírios propositais de gente perturbada,
e maldosa, e mentirosa e covarde,
que escancara o pavor, que cita denúncias inverídicas

Saudade do progresso que se almejava,
saudade eu tenho da democracia
antes de ser estrangulada

Diante de suas ausências

Diante de suas ausências
nem mesmo as ilusões sobrevivem
diante de suas faltas
nem mesmo os fatos coincidem
diante das inconsistências
que se agridem
existe um quê do fato
abstinências das realidades que nos oprimem

Diante das percepções distorcidas do todo,
o ontem já deixou de ser ontem e foi embora,
a ansiedade do hoje sem você sumiu
o amanhã me pertence

Não sem memória de que você existiu
e foi embora
não sem lembranças do que a gente viveu
e se evapora

Não se trata de deixar o passado pra trás,
nem de fechar a porta, nem de encerrar ciclos,
nem de acerto de contas, nem de desculpas,
nada disso se elabora

Diante de suas ausências, nem o vazio
me ocupa agora
nem um estado servil
me aflora

Diante de suas ausências
se descobriu que fui eu
que flui embora

Incompletudes imprecisas

Eis que sinto ausências
passadas a limpo
presentes no limbo da memória

Eis que sinto desconfortos d’alma
que a mente ainda não decifra,
sequer investiga, nem busca respostas

Eis que esse estado confunde,
ilude e decepciona sentidos,
sentimentos, semi-círculos de vivências,

Incompletudes guardadas em versos imprecisos

Necessários
Deslocados em estrofes

Eis que sinto vazios não percebidos
lacunas do tempo do eu que não sofre
sem fundamento, e sem angústias

Contemplação das incongruências
de existências não lineares

Novo amanhecer

Esse poema é um agradecimento à vida
que me permitiu um amigo tão distante
ser perto

Esse poema é dedicado a todas as horas
que você divide comigo, mesmo brincando
são momentos da existência que não voltam mais
– nem seus, nem meus –
e nós escolhemos viver juntos

E nos divertimos juntos, rindo sempre
com a certeza e de peito aberto
de que merecemos momentos de alegria

Jonh Garcia, esse poema não retrata as fases da sua vida,
não pretende te encher de nostalgia, nem curar sofrimentos passados;
Esse poema fala que o presente se faz abençoado quando a gente se permite
ser levado a sério na nossa real maneira de ser, de ser lindo, sendo eu, sendo você

Esse poema fala que vale a pena tudo que a vida nos deixa de lição,
e por que não ser feliz sem condição?
Esse poema fala que no mundo tem gente para tudo,
inclusive, mãos que acolhem, compreensão que vem distante,
companhia que mora longe, mas, te quer bem

Esse poema fala da sorte de quem te escreve,
porque sabe te ver forte mesmo quando você não se vê
Esse poema conta uma história que nem você é capaz de conhecer

Ah, claro, esse poema é pra você
porque coloca em versos não só elogios, nem só maneiras de te enaltecer
Esse poema fala do seu futuro
fala de um homem puro que você ainda vai aprender a ver

Esse poema fala tanta coisa que ainda não pode ser dita,
mas, sobretudo, esse poema é alegria que irradia vinda de você
Esse poema, sem forma e sem métrica acerta porque a vida é autêntica
para um novo amanhecer