Desconstruindo pessoas

E quando não se dava nada por alguém,
a doação total constrangeu,
e quem disse que o mendigo na rua
é coitado, a compaixão dele cedeu
a partilha do pão de ontem

E quando se achava um ser humano perdido,
perdido foi o ego ferido, quando ferido,
por aquela mão que se estendeu

E quando o cuidado necessário se fez presente,
mas o dinheiro não pôde bancar,
quem nunca foi cogitado se ofereceu sem centavos.

O idoso moribundo ainda pode cuidar das crianças,
a criança frágil e pequena diz verdades escondidas das outras bocas,
o jovem imaturo também ensina que a coragem não se ensina,
quando o sistema sufoca tantas adultos maduros,
o deficiente é servidor público que trabalha e não foge do ponto,
e o ponto final é só um blefe.

A vida nos pede a reincidência das reticências

Transbordo

Na dor, no sofrimento,
na aflição, lágrimas
Na plena felicidade,
água

Lágrima pra quem chora
de dor e de alegria,
água

Que benze e que lava,
que consome, transforma
a praga

Lágrima pra quem sonha e realiza,
pra quem só idealiza e não consegue.
Água

Lágrima que pede socorro.
Lágrima que agradece

Transporto e transbordo
a bordo da vida,
derrama o óbvio
o copo do Vivo

Perfeitamente presente

Chega um momento na vida
em que você para de pensar em você,
e se preocupa mais com o outro

Chega um momento na vida
que a sabedoria te proporciona
ver que o que você tem não é muito,
mas é muito mais do que o suficiente

Chega a hora em que você deixa de lado
os seus pedidos e clama por outra pessoa,
você vence a inveja, a ingratidão,
você derrota o egoísmo e põe os pés no chão

E cuida do próximo, e reflete a sua evolução,
e solicita amparo não pro carro caro,
ou o telefone último tipo,
ou a calça cara com a etiqueta colorida,
nem a joia reluzente no braço

Chega o dia m que a mão de outro é mais importante,
que a amizade de outro é que tem valor,
chega a hora que resguardar quem está próximo de você
também é a sua própria defesa

Chega a hora da mais sutil gentileza,
a benção, a grandeza de se sentir suficientemente presente,
presente de Deus que dá tranquilidade para ir ao outro
para se fazer presente, presente de mudança,
perfeitamente presente da presença de Deus

Princípio da ponderação

É bem rente ao corpo,
bem dentro dos olhos,
é bem próximo da verdade
que se encara a realidade

É sem medo da vida,
é em respeito próprio,
por considerar o próximo
parte de mim

Parte de mim muita responsabilidade,
parte de mim sempre a justiça da ação
– parte de mim o signo da balança –
o princípio da ponderação

É com os olhos d’alma que se vê
– profundo e sem receio –
que a vida revela
muito além do meio termo

É para tirar as dúvidas daquilo que é relativo,
para seguir a diretriz do correto, sem vacilo,
para aquilo que ninguém percebe que precisa de proteção
é o cuidar do outro sem solicitação

É inerente a mim, antes de tudo,
antes e até mesmo sem laço afetivo,
antes e até mesmo sem troca, barganha,
antes e até mesmo sem ganância, ninguém sonha;
antes e até mesmo, até mesmo antes
de qualquer desconfiança

O Eu que mora em Mim

Eu
sou o cara
da piada pronta
do raciocínio rápido
do humor do improviso
e do ato imprevisto

Eu
sou o cara que não procura,
mas se acha a cena certa,
acerta e vai em frente
com coragem e de peito aberto
aquele que não mente

Eu
sou o cara que observa
sou mera leva daqueles que se importam,
assumo a culpa daquilo não feito,
desse jeito que mata no peito o problema,
o lema da coragem, que dá a cara, as duas faces

Eu
sou a fase que segura a oportunidade,
fruto da confiança na espiritualidade,
aquele que abre caminho, fortalece o próximo
o lógico que encurta o problema,
e resolve

Eu
sou o abraço inesperado,
a outra cara da moeda que vira
no tapa que a vida dá no pulso

Eu
sou o impulso do que será o amanhã,
sou o divã do passado, o silêncio que responde,
sou o bonde esquecido, o mais charmoso coletivo,
não deixou o sorriso antigo ser morto,
o representante dos esquecidos sem voz

Eu
sou aquele que desamarra mais nós
que as orações sem atitude,
o fugitivo das escrituras inúteis,
a ação que desilude e desperta,
a peça que ninguém toca

Eu
sou o medo da mudança,
aquele que toma a frente,
o primeiro dos loucos
que todos depois seguem

Eu
sou a Dimensão que se expande, o big-bang,
aquele que tomou ciência da amplitude de ser
Eu