Pequenos ponteiros

Não há pausas para a vida,
disso só me resta dizer que são evidências,
ora, serve, segue e guia
porque quando você deixa de prestar atenção em algo,
outra demanda merece seus cuidados

É certo que, nessa curta vida,
não temos um só segundo de descanso,
porque, desde que nascemos,
somos cercados de desafios

De todo caso, não reclame,
o que você é capaz aqui,
é pequenino perto da grandiosidade da eternidade

Sim, é verdade, que durante as poucas somas de décadas
pelas quais temos vivido, ainda há muito a mudar,
a ponto de parecer luta perdida, coisa que nunca termina

Deus criou você e criou a formiga
e nenhuma obra-prima tem valor menor,
nem a duração equivocada
porque o tempo é uma dádiva
complexa nos segundos,
banal nas horas.

Pirotecnia

Hoje a chama dos meus olhos explodiu
combustão de te amar escondido,
cercado de pensamentos, é bendito,
o sentimento que se alastra pela alma
e comparece

Descontrolado, não há o que fazer,
deixa apenas consumir até o fim,
as labaredas do intenso fogo,
que queima até o último segundo
as noites de sono que eu não dormi

Destroços de solidão se foram,
restos de angústia não deixaram vestígios,
os amores antigos, não se recuperam mais,
a falta de afeto se perdeu rapidamente

Sorridente, esse fogo diferente
aquece o corpo, ilumina a mente,
é estridente, os estalos que a paixão
nos faz contemplar

Somos nós a mais linda pirotecnia
para festejar as viradas que a vida dá,
sem medo e sem receio de se machucar

É quente, é gostoso e aconchegante,
é conforto, cuidado completo
é êxito, excessivo abençoar
o contrário, o reverso do pecado,
que pecado o céu não ter fogo
para o nosso balão de amor subir
por isso, nos amamos aqui na Terra

Não atrapalhe – o silêncio –

Que o dia não nos obrigue
a ficar provando nada a ninguém,
pois, se cada um toma conta de sua tarefa,
é certa a falta de tempo para pesquisas alheias

E se der conta do seu próprio servir,
sirva mais, de outras formas,
antes de vir a mim
dizendo que não faço nada;

A fofoca é praga perigosa
que destrói a horta das boas amizades,
apodrece o respeito e a admiração

Cada um cuida do outro
de um outro jeito que você não cuida
e é por isso, que mesmo na labuta,
as pessoas buscam a todos nós

Pois, que cada um tem uma forma distinta
de desatar os nós da vida,
acolher o outro,
e ajudá-lo a dar a volta por cima

Eu peço, antes de tudo,
que se o desconforto comigo for grande,
não se adiante a comentar com mais ninguém

O silêncio do insatisfeito é falta de respeito
quando não dito a quem se deve,
usando terceiros de escudo

A alma humana tem tantos atributos para serem descobertos!
procure o que fazer, antes de dizer palavras infundadas,
cada um dá o melhor de si nessa experiência abençoada
e eu não desejo mais pra mim, outra palavra confiada,
a não ser – “silêncio” – para a vida perturbada

O incapaz

Eu sou o incapaz do século 18
negro escravizado que não viam como gente,
eu sou o incapaz do século 19
criança e mulher, – velho até – da jornada de trabalho absurda
eu sou o incapaz do século 20,
mulher, subjugada, incompetente para o alto cargo
Eu sou o analfabeto do século 21 que assina com os dedos,
sou o deficiente ainda visto como o doente merecedor de cuidados,
subestimado como o coitado da assistência social,
superestimado como o super-herói que venceu,
o exemplo, fora da curva.

Eu sou o começo de luta
que não podia votar,
não podia usar calça jeans,
não podia sair de casa,
não precisava estudar,
sustento que venha de terceiros

Eu sou o que não aceitou
o fato de ser menor ser humano,
fadado ao fracasso social
certo do destino ingrato traçado

Eu sou o incapaz
de aceitar a incapacidade posta
pelos capazes que sempre viraram as costas
do alto de suas concepções de merecimento

Eu sou o incapaz
de aceitar o farelo merecido aos porcos,
doado aos poucos,
pelos próprios incapazes
de ver a vida na sua plenitude

Eu sou o incapaz de não escrever sobre isso,
sou o incapaz de não ter atitude,
aquele grita mesmo, que fala ríspido e rápido
para ver se me respeitam

Eu sou aquele incapaz de engolir a demagogia
dos espaços das cotas de pouca representatividade,
eu sou a incapacidade da arte não decifrada,
eu sou o que não se dava por nada, – e surpreendeu –

Eu sou o esforço que não cedeu,
vencido pelo preconceito – jamais –
prazer,
– o incapaz

Rascunho

Ainda não é você
que enlouquece de amor por mim,
que se preocupa como eu gostaria,
ou se declara, tentando fazer poesia de atitude,
ainda não é você quem me busca a qualquer hora do dia,
faz surpresa, prefere a minha companhia,
ainda não é você quem me prioriza,
faz de mim lembrança de música, de um momento,
saudade quando está na fadiga,
que quer meu colo quando está sem saída

Ainda não é você que compra coisas pensando em mim,
espontaneamente me chama pra sair, e que diz sim,
sim, eu vou, eu quero, é só chegar, não é você quem diz
você não precisa marcar, não precisa agendar,
ainda não é você que merece viver ao meu lado

Ainda não é você
apesar de importante,
apesar de especial
de boa companhia,
de uma boa dose de alegria,
de paz de espírito,
mas, ainda não

Ainda não é você que provoca o meu espírito
a vir a tona, não é você que acorda o meu passado,
escondido e espaçado, que eu ainda não tive acesso

E, confesso, queria que fosse,
mas, você não é. Não é. Ponto.

Quem sabe, no próximo eu encontro,
mas, você não é. Definitivamente.

Sem meta

Eu já fiz muito,
sei que não se começa assim
um poema de começo de ano,
mas, compondo esse novo momento,
sem nenhum lamento, olho pra atrás,
porque há o que valorizar no ontem

Eu vou fazer mais,
ainda que não saiba
por onde ir, ainda que sem metas,
vida aberta, como o livro análogo,
liberdade de não ter rumo,
não nesse ano

Eu vou ser melhor,
sem rota, sem reta,
sem placa, sem trava,
sem meta

Objetivos, já busquei demais,
cumpri tarefas em excesso,
passei por anos idos de crise,
não quero crise mais, minha vida,
não vai ter mais ajuste fiscal,
não cometo mais crime de responsabilidade emocional

Vou me desfazer das pessoas doentes,
não quero mais ser paciente com quem
não quer se curar, eu vou me cuidar,
vou viver, viajar, me presentear,
vou ser leve, vou rimar mais,
rir mais alto e melhor

Vou fazer piada, chorar de risada,
vou buscar a minha atitude plena,
cansei de ser pequeno em alto mar
vou me derramar em oceanos,
atravessar o mundo, leve,
apaixonado pela vida que corre,
não comporto mais comportas,
não vou me sujeitar a barreiras,
nem buscar companhia… viver,
viver a maresia da minha própria poesia…

Substitutivo de saudade

Gosto de gente que tem caráter,
que fala e sustenta a fala até o fim.
Gente que tem princípio,
quando diz sim é sim,
daqui cinco minutos ou cinco anos
 
Gosto de gente que questiona,
que rebate, que argumenta,
gosto de gente atenta e de olhos abertos,
de gente do tipo esperto, ligado,
capaz de desconfiar das intenções terceiras
 
Gosto de gente parceira
que não vai me jogar na fogueira
na primeira oportunidade
 
Gosto de gente certa por completo,
que não olha o nome do processo,
e fica fazendo média
 
Gosto de gente que erra tentando acertar,
e se assume, e se corrige, e se retrata também.
Gosto de gente que, como ninguém, sabe falar o necessário,
sem ofender, sem criticar demais por puro desprezo,
gosto de gente sem rodeios, que diz o preto no branco,
sem enfeitar, sem os floreios
 
Gosto de gente que não assina embaixo sem ler,
gosto de gente que revisa, sugere, suprime e acrescenta,
gosto de gente que ensina sem arrogância, aprende sem prepotência,
gosto de gente que pede da paciência à clemência sem perder a autoridade,
gosto de gente que fale de moralidade, praticando,
gosto de gente que comenta de impessoalidade sem olhar o sobrenome
gosto de gente, de gente, gente, que assume a figura pública
sem perder a particularidade.
 
Gosto de gente, de muita gente,
de gente que ficou insubstituível
no substantivo saudade.

Ficaste

(fim de ano)

Alegra-te, pois que chegaste até aqui,
ao fim de mais um ano, tu venceste,
muito enfrentou durante tua trajetória,
posto à prova em tantos momentos,
colha o renovo das plantações que semeaste

Vivenciaste o que era próprio da existência
e com paciência, resistes aos sofreres da matéria,
em matéria de aprendizado

Alegra-te, é a hora!
Inspira-te, renova-te!
Aviva-te, o impossível
aconteceu!

Tu sobreviveste!
de janeiro a dezembro,
o ano se foi, ficaste!

Fica em alegria,
finca a alegria,
em teu peito,
energia, fica!

Nada vai virar,
continuarás servindo a vida!
Servir e bem dizer que a vida te deseja.
Compromisso com a vida, abençoa-te!

Terapia

Coisa que não me falta é caráter,
não me faço de moeda de troca
me vendendo pela metade

Não me comparem com um idiota,
desse grupo não faço parte,
estou atento a tudo,
não me venham com sacanagem

Não aceito tapinha nas costas,
nem o sorriso falso,
nem fingida camaradagem

Não engulo desculpas frouxas,
meias-voltas para contornar situações,
eu digo mais, e sinto muito,
sou deficiente físico apenas,
não fecho os olhos para a pilantragem

Pilantras camaradinhas sacanas,
não é só os políticos diplomados que me incomodam.
São os abutres do dia a dia,
que não sabem o que querem, não mostram a face,
mas, as duas caras, as máscaras, colecionam

E reclamam do mundo, e reclamam da vida,
e reclamam lá de cima, até de Brasília,
mas, não mudam, não tomam atitude,
não mudam de trilha.

Amordaçam a boca, põem vendas nos olhos, tapam os ouvidos
e tudo, tudo, – convenientemente e coniventemente –
relativizam.

É o meio erro, o meio certo, é o quase isso,
é a falta de norte e de norma, de parâmetro,
é a ética jogada na lama para não se estressar,
é a moral jogada na lama para não se indispor,
é a cidadania jogada na lama para não perder o aplauso,
é o príncípio jogado na lama para não perder a estima,
é a lama, é a lama, é a lama

Tratamento facial para deixar a cara macia,
é o que vier, de cortesia

Ganha a fama quem deita na cama
e não faz terapia

Retorno

Me descobri feliz no viver,
ainda que cercado de turbulências,
me descobri realizado no servir,
me percebi sereno para o aconchego
pelo pleito, pela demanda,
pela necessidade humana,
de uma direção, de um afago.
Me descobri abençoado,
cercado de espiritualidade,
desde que saio de casa,
quando um batalhão me acompanha,
protege e me orienta a ir ao mundo
anunciar a paz, a praticar o bem,
a não ver a cara de ninguém,
a não ligar nome com pessoa,
a ser indiferente ao ego
eu me ergo, sou completo
do abraço que eu não nego.
Aprendi muito, construí, primeiro,
a base sólida por dentro,
inabalável porque há preparo,
há muito tempo, há aprendizado,
amadurecimento para estender a mão
e não ser puxado para o abismo,
mas, trazer o outro de volta,
de volta pra vida, pra mim.

Imenso amor

Eu acho que a gente já entendeu
que no nosso caso, o amor não é um acordo,
entre seu corpo e o meu, nem entre seus olhos e os meus,
nem sobre seus desejos e os meus

Eu acho que a gente já entendeu
o significado firme e forte,
o elo que nos une além da morte,
a sorte dos nossos reencontros
no tempo e no espaço,
e no estado de paz

Não é questão de falar sério,
ou, de pensar mais a frente na eternidade,
é mais simples, porém, mais sólido,
é a certeza da segurança, da grande confiança
que a minha voz não fala, que a sua timidez não deixa,
é, em certa medida, a vergonha que a gente pragueja no íntimo

A questão é que a gente tem muito a dizer
de forma leve e divertida,
são os sonhos que brilham na esquina da alma quando a gente viaja
nos nossos planos de muito tempo pra frente

A questão é que eu sou parte de você,
e você, parte de mim; sabendo,
que o que parte de mim pra você
é imenso amor

É imenso, amor
o que nos conecta,
o que nos trouxe até aqui

É o nosso aprendizado contínuo,
sabendo que a gente se merece
e que o mundo nos amadurece
para a gente se receber lá na frente
meu presente, eternamente.

É imenso, amor
o que o meu coração agitado decifra,
o que a minha mão quando aperta a sua sente,
é a fala, que quando sai, vai tão trêmula,
mas, mas, não insegura do que eu preciso

É imenso, amor
o que eu tenho confirmado, é bendito,
saber que seu abraço ainda tão pequeno, é vivo,
é imenso, eu insisto, o que a gente vem descobrindo sem pressa

Que nesse mundo, não adianta ser presa dos outros homens,
eu sou um grande homem, querendo o mais honesto dos sentimentos
com um pequeno homem, o melhor dos pares que nem milhares de caras
serão caros de significado da aliança que só você se fez – e me deu.

*Para Hiago Tavares

Corpo celeste

Não é hora da divisão,
senão do pão na mesa, de abraço,
de incertezas aflituosas
que podem ser sanadas,
ajustadas – ainda que penosas –
porque é na dor do outro
que eu encontro um igual,
tão preocupado, ansioso,
confuso e cansado,
porém, mortal.

O limite do humano
tão cheio de dúvida,
merece, hoje, concentração,
de forças, de energias,
de compaixão.

É todo mundo junto,
na mesma vida, no mesmo mundo,
cada um com seu problema,
seu dilema particular.

Se é pra ficar com algo em mente,
o lema de toda a nossa gente,
solidariamente, na solidão, em frente!

É esse o recado que se quer passar, em suma:
Assuma, que ainda tão diferente,
tão confuso, o seu mundo precisa do mundo do outro,
porque o universo quer seus planetas em órbita.

Eu sei que você habita um corpo,
e orbita outros corpos,
são todos celestes,
e merecem a mais primária prece humana
a contemplação ao nada, ao tempo.

Um momento:
o céu só fica belo
porque cada estrela, que se sente pequena e só,
– anos-luz distante uma da outra –
(está perto)
– anos-luz distante de eu e você –
(para nós).

Poema dado

Se eu pudesse me disfarçar
de festa, de sorriso largo,
se eu pudesse dizer que me faço
de abençoado o tempo todo,
que bom seria a vida,
se eu pudesse escolher
o que eu faço e como me sinto.

Mas, na verdade, o sorrir é um mito,
o abraço de amigo tenta confortar,
mas, só eu sei o que eu quero juntar
nesse entrelaçar de carinho

O meu vazio me permite
o falso preencher de contentamento,
mas, por dentro, lamento;
é um mundo obscuro que eu entro,
e me tranco, e me lanço, e parece,
que mesmo em prece, eu não consigo voltar

Se eu falasse o que dói de verdade,
se eu soubesse identificar,
o que está por dentro do corpo,
eu não precisaria me arriscar
a perder a vida, tentando ganhá-la

Essa minha fala, tão simples,
e tão verdadeira…
me sinto a beira do silêncio,
e
vou
me
jogar

Assumo as consequências, e peço clemência
à divindade que me criou, mas, eu não consigo suportar,
que nessa vida, eu não tenho vida, e na próxima,
se houver alguma, eu também não terei,
temerei eternamente o que eu não pude aproveitar

Por isso, responsabilizo o mundo,
sou fraco, querendo ser forte,
e me sinto imundo,
mas, o poema vai me limpar…

O poema vai me benzer,
o poema vai me proteger,
o poema dado foi lançado
pra me demover do não viver,
pra reviver

Oração de abre caminhos

Deus contigo vai,
e ninguém mais te atinge,
pode vir pedra, pode vir ódio,
não desiste, e segue

Palavras de ódio não te abatem,
o corpo agredido não dói,
o cansaço faz parte,
segue sem alarde

Ladeado por todos os anjos,
você está no centro,
cabisbaixo e derrotado,
o mundo assim percebe

Mas, você sabe que o semblante engana,
a oração humana ainda é uma parcela,
você sabe o que completa o seu ser,
forte e recompensado, sensato,
o invisível para os outros,
não pára você

Confia e aguarda,
o guardião máximo alarga a estrada
por onde você nunca pensou passar

Ele vai na frente enquanto na madrugada,
você ainda dorme protegido e cercado,
segue seu caminho com o passo pequeno,
que quem pensa estar na frente, na estrada,
seus algozes, gente indisciplinada,
ainda vai voltar, pegou rumo errado

Na trilha do silêncio, o passo posto em dúvida,
não há angústia, segue na quietude, isso é virtude,
não importa quantas vezes você caia, é por aqui.

Desvia de um e de outros, os deixe ir,
sei o quanto você chora de dor,
enquanto muitos riem no passo fácil,
o machucado da queda será curado,
porque a oração que abre caminhos turbulentos,
não veja os lamentos, na oração que abre caminhos,
são os melhores, os melhores caminhos se abrem,
por dentro.

Separado

O mundo vive há eras
sob tentativa e erro,
e, por isso, sofre,
sofre, erra, erra,
e se rebela,
entre tentativa e erro

Poucos são aqueles
que passam entre a direita e a esquerda,
o caminho reto, renegando a lágrima,
negando o falso, resistindo à dor,
preservados na segurança da paz de espírito,
e em alegria, em humildade, aparente solidão,
deslocados da multidão que erra, chora, sofre,
delibera entre mil caminhos perdidos

Enquanto o mundo estiver em ebulição,
fervendo em ódio, em guerra, em discussão,
em inveja, em intriga, na contramão

Segue sozinho, ouvindo a oração,
que Deus preserva, cuida, abençoa,
protege, elege, liberta e livra,
caminha mesmo que não souber o destino,
escuta e observa o convívio

Quantos se doem, e choram, e se calam,
e não sabem o que fizeram de errado,
e, calado, você passou por tanta coisa,
quieto e humilhado, desconsiderado,
foi colocado à parte,
evidência de Deus

Matilha

Não me leve a sério,
eu não me quero sério,
sério, eu cheguei aqui pra rir,
e confundir, sou ser mistério

Sinto muito, se com você eu não tenho elo,
meu bem, minhas atitudes tão rudes,
meus passos, tão impiedosos,
eu sei que o medo está nos seus olhos,
eu sei que seus ossos estremecem em receio

Ceio a sua ansiedade com risada,
a sua praga anunciada não cola em mim,
enquanto seu santo aprendeu a retardar meu passo,
o mundo inteiro, dos deuses gregos até a macumba elétrica,
corre pra cima de mim, pra me proteger

Enquanto você me observar como aquele que deve respeito, tudo bem;
não sou ninguém melhor, o pior é você quem constrói;
não sou feroz, perto de você sei rosnar,
o medo de morder te  fez fugir, e eu, ri,
ri porque você corre em vez de me encarar.

É por isso que a matilha se convenceu
que eu sei liderar,
a alegria de contar,
a conta-gotas,
você não sabe brincar,
porque me leva,
me eleva – sério –
me leva a sério.

Curadoria

Sua beleza incomoda a minha íris,
tão chocante é aos meus olhos
que reação não me permite,
o meu corpo te assiste

Paralisado fica todo o meu ser,
a obra de arte que a vida cedeu ao viver.
É um escândalo, que não tenho voz,
perplexidade faz os meus dedos virarem em nós.

Perdoe-me o silêncio,
a falta de palavras,
o contemplar por mero instante,
fui ultrajado pelo tempo terreno,
mas, a minha mente é eterna viajante

Sinto muito até mesmo a desculpa,
tenho que dizer que não é minha culpa,
pelo imóvel que perdeu os alicerces
e desmorona antes da reintegração de posse
consciente.

Para que você fique ciente do tudo que me causa,
quando não me faz nada, obra de arte tombada,
preservo até os escombros desse conto em verso,
conto apenas com a sorte da memória, ora revelada.

Seu corpo, seu cheiro, sua voz,
seu cabelo, seu jeito gentil e veloz,
a minha quietude, minha taquicardia,
minha fala que não saia,
inauguraria, muito antes,
o encontro das duas artes

Curadoria que não curaria
nem metade dos impactos históricos
causados em qualquer tarde.

Educando

Prazer,
eu sou gentil,
o senhor foi bem atendido?
Quer uma água, um café?
Posso ajudar em alguma coisa?
Se eu não souber, vou aprender contigo.

Obrigado por tudo que tem feito,
eu sei que o cuidado, além de raro, é suprimido.

Deseja mais alguma coisa?
Volte sempre que quiser,
venha fazer uma visita!

Claro que eu posso parar,
isso aqui pode esperar,
tenho a mão estendida.

Claro que pode trazer,
é um prazer, de novo.

Não, não se preocupe,
vou procurar saber.

Imagina, não me traga nada,
desculpe, não posso aceitar,
estou aqui pra isso,
não vou barganhar o meu atender

Porque, no meu entender,
serviço público não tem cliente,
sirvo ao povo, cuido de gente

Sinto muito, não se queixe,
não se deixe abater pela vida,
fico feliz, com seu sorriso, no fim,
mudei a rota do seu dia

Não por isso, não por mim,
eu sou assim, simpatia e acolhida.

Cuida da sua mãe,
vai procurar um médico,
claro que vai dar tudo certo,
boa aula, não se irrite com a vizinha

Tente sim… essa possibilidade…
não garanto, só tenho boa vontade,
se errei, me desculpe, não sou perfeito

Perfeito, perfeito
que bom que me entende,
pede licença sim,
se tem direito

Estude novamente,
se puder ler com cuidado,
esse item aqui é bastante claro,
não, eu não falo pra prejudicar,
se você observar, não vai ser dessa vez

Mas, enfim, se você não puder ir,
vou anotar aqui, e entro em contato,
procura o meu outro colega,
que essa parte, quem dera, mas eu não posso fazer

Não corra, dá pra resolver mais fácil,
vem, senta aqui do meu lado,
vamos fazer o passo a passo,
pronto, efetuado.

Está lá, vai buscar, mandei imprimir,
até mais ver, até qualquer hora,
passa aqui outro dia pra me dizer se deu certo,
certo, certo, certo, não precisa agradecer

Eu vou sentir falta de você,
mesmo aposentado.

Ah, e no seu tempo…

Toma. Lá, não precisa dar cá.
Além de um prazer, foi um agrado.

Por ter feito tanto, quer só uma via?
O que o senhor não via?

Prestigia, o aprendizado.

Solzinho

É meu pequeno príncipe,
minha história infantil preferida,
meu amigo, minha companhia,
meu sincero verso, tão sutil,
tão singelo, meu guerreiro,
combatente, com você sou mais gente,
meu cuidado mais próximo, meu presente,
meu pensamento distante e próximo,
meu elo com a vida, sem solidão.
É meu sorriso mais simples,
meu brinde de fim de dia,
é minha primeira alegria na manhã,
minha ligação de cuidado,
é meu contato, meu comparsa preferido,
é meu abraço, meu abrigo, meu imprevisto,
é meu desejo mutável, meu fardo favorito,
é minha emoção, meu pequeno botão,
meu bordão, meu coração que bate feliz,
é tanto, o meu tudo, meu eco profundo,
meu viaduto para atravessar o escuro,
é passado tão recente, repito, meu presente,
enquanto eu tiver vida, meu futuro,
o amor causa esse impulso, tão parte de mim,
que me sinto seguro, mesmo tão instável,
é o meu silêncio imediato para não chorar no poema,
que diz tanto, na eternidade, sempre seu, sempre metade do Tavares

*Para Hiago Tavares

Eletrônico

Quando escrevo, ainda que de forma eletrônica,
é espontânea a forma como o pulso se curva,
de certa maneira, ainda sinto o peso da caneta,
na assinatura digital

O cheiro de tinta não me inebria mais,
assim como o pó de giz não me suja mais,
nem os pequenos estalos da máquina de escrever,
com suas tantas garras a bater no papel

Eu ainda tenho o mesmo agito de outros tempos,
sinto o velho que mora aqui dentro se manifestando,
em tão profundos sentimentos que as palavras carregam,
mesmo nos versos simples, corriqueiros

A palavra é um pequeno instrumento,
ela carrega muito mais do que está posto,
meu sentimento é segredo exposto
para quem sabe ler, ler as entrelinhas,
os versos, o que está por dentro,
colocado, agora, para fora,
não importa com qual meio,
estou aqui por inteiro

Institucional

Ainda tenho tempo para o poema,
– como se eu precisasse de tempo –
— o poema está em mim, o tempo todo —
para alguns poucos versos nesse final de dia,
movido a aprendizado e imensa alegria do aprender

Não sei você, mas eu sei observar,
tem coisas que eu preciso considerar,
nem sempre eu digo, nem sempre se sabe por mim,
mas, é preciso registrar:

As oportunidades multifacetadas que a vida me concede,
cercado de gente que sabe que sabe,
e sabendo que eu ainda tenho a saber,
não sei você, mas, meu verbo é agradecer

É por isso que eu aproveito, como a academia diz,
para beber de muitas águas, e eu não preciso fazer referência bibliográfica,
eu não preciso citar seus nomes, mas, ainda está em voga:

Seus ensinamentos, no futuro ainda, lá na frente,
me outorga competência, entendi o objeto da ciência da Educação Profissional,
ser aprendiz, ser artífice, ser técnico, ser professor, ser – depois de tudo –
convivência humana, na excepcionalidade que não ressalva,
mas, exalta toda a trajetória, o imenso legado institucional

Sem norte

Meu amigo,
tanta gente precisando de um abraço,
de um ouvido, de um tempo, de falar sem ser interrompido

Meu amigo,
tanta gente carente,
tem tudo, saúde, saudade…
cê parte, amigo,
elas ficam sem alento

Meu amigo,
oração é unguento
para o tormento d’alma

Calma, meu amigo,
que a vida é curta,
sê disponível,
abrigo pra quem precisa viver

É a angústia doendo,
é o ressentimento,
é o mal entendido,
é o coração fervendo,
o sentido que está se perdendo…

Amigo, há ponte do outro lado de nós,
são tantos, algoz, de tantos…
é tanta certeza na certeza de cada um,
é o perigo de não sermos um

Amigo, tenha tempo para os lamentos,
dos muitos que têm muito e não são nada,
vida cheia de vazios que não preenchem nada

A cada palavra que você escreve, a cada mensagem,
a cada conversa simples do que precisa ser dito,
toda vez que você mergulha no íntimo de alguém,
você tem acesso a um outro mundo que nesse mundo
poucos alcançam

Tão cheios de si, com tantas máscaras, tantas capas,
tantas marcas, subterfúgios, você, desnuda profundo,
o núcleo primeiro, a potência do ser que deixou de ser
para carregar o que não é…

Você não é daqui, ajuda quem acha que é daqui, a progredir.
Você sabe que isso passa, a vida é curta, sabe da loucura da vida…
da finitude desse tempo terreno, conhece a força de outros astros,
ajuda a criar laços que retirem os nós, ajude-nos;
a não criar mais mundos de aprendizado, como o Planeta Terra.

Tão pesado, tão denso, tormento, de dor e de imenso sofrimento,
nós não o queremos, nem você, mas deixa o recado, deixa a oração,
deixa a mão estendida, deixa a sua vida a serviço de outras vidas,
outras vidas, sem norte.

Problemas alimentares

Vou te falar que a vida as vezes é chata demais,
é pesada demais e tem muitos problemas,
vou te falar – e a gente sabe – dá vontade de jogar tudo pro alto,
é um fato.

Mas, e daí que está tudo complicado, tem guerra no mundo, doença,
tem gente que tem uma péssima crença, do sempre pra baixo.
Não precisa ir muito longe pra reclamar do mundo,
nem olhar o noticiário, do Rio, a bala perdida,
de Brasília, dinheiro roubado, o Trump comandando o mundo,
Temer, rasgando direitos, o colapso dos refugiados,
os ataques na Síria, o Estado Islâmico assombrando o planeta,
fazendo do nome de Deus o Capeta,
de todo certo, está tudo errado

Vou te falar que a vida as vezes é doida demais,
e pra reduzir o nosso pesar, vou te falar,
naquilo que dá pra agir, naquilo que dá pra mudar,
naquilo que dá pra fazer, enfim, o que eu posso fazer…

Tem gente que reclama de tudo, se faz chuva, se faz sol,
se o dinheiro não vai até o fim do mês, se acabou o sal,
tem gente que reclama de não ter roupa nova,
mas, também não tem o mínimo gosto pra música,
tem gente que escuta Anitta no meio da chuva,
e pragueja de vagabunda

Tem gente que joga lixo na rua,
depois reclama da inundação,
tem gente que diz: nada consigo,
mas, meu amigo, você nada fez

Não estuda, não progride,
não muda de apetite,
reclama da comida todo dia,
não muda o jeito de fritar o bife

Não troca de rota, não pega o ônibus,
reclama do preço do álcool,
reclama de dor na coluna,
não muda de cama

Reclama que o marido perdeu o interesse,
não mudou de marido,
reclama que a filha não ajuda,
não cobra da filha, não se indispõe

Põe uma coisa nessa sua vida, mudança
não pragueja a roupa surrada,
compra menos pizza, troca de capa
pára de reclamar do chefe,
muda de área, começa outro momento,
para de forçar um lamento que você não tem

Cansa de contar vintém, não conta!
canta! canta primeiro!

Não é o mundo que tem problemas demais,
é o seu mundo, que tem problemas demais,
porque você tem medo de ter problemas de menos,
e encarar seus lamentos, que não te alimentam mais

Depois da vírgula

Para o músico, o maestro;
para o aluno, o professor;
para o poeta, o firmamento;
para o doente, o médico;
para a abelha, a rainha;
para o índio, o cacique;
para o faroeste, o xerife;
para a banda, o vocalista;
para a nostalgia, o tempo;
para o bebê, a mãe;
para o órfão, a tia;
para o esporte, o técnico;
para o pintor, a tela;
para o ator, o diretor;
para o evangélico, o pastor;
para o católico, o Papa;
para o espírita, Kardec;
para stephen hawking, o nada;
para o eu, o verso;
para a vida, a eternidade;
para o escritor, o editor;
para Joelma Vieira, o RJU;
para o convidado, o anfitrião;
para o manobrista, o patrão;
para a canção, o ouvinte;
para o rádio, locutor;
para o empregado, o chefe;
para o colaborador, o líder;
para os livros, bibliotecário;
para o País, o Presidente;
para a mente, psicólogo;
para o carente, o colo;
para o bloco, o mestre-sala;
para a fala, a palavra;
para o ateu, o fim;
para o pijama, a cama;
para o artífice, o belo;
para o desejo, a ação;
para tudo, um exemplo;
desse lado, ou do outro;
para o pouco, o muito;
para o seguidor, liderança;
para os atos, segurança;
para depois da vírgula, confiança;

Renúncia

Eu não tenho tempo de falar de coisas tristes,
porque a minha ocupação é com o outro,
não tenho tempo para falar de sofrimento,
porque a minha finitude me lembra diariamente
o quanto eu ainda devo manter a mão estendida.
A grandeza da vida não está no quanto eu posso carregar de dor,
mas, quantos sorrisos eu sou capaz de abrir, tendo eu, tudo que preciso.
Uma luta ou outra – para alguns – é tarefa árdua, um peso a mais,
mas, pra quem faz disso a oportunidade, trata-se de crescimento, aprendizado.
Os fardos e os fartos do Eu, ditos em poema não amenizam coisa alguma,
mas, tornam a vida mais simples, mais bela, mais oportuna.
O poema, o ritmo, a rima, a palavra cadenciada,
tem o mesmo fardo da prosa, tão pesada, tão penúria.
Eu peço renúncia do peso da batalha,
eu peço renúncia da dor aguda,
eu peço renúncia da primeira lágrima,
eu peço, renúncia.
De tudo o que me cansa,
de tudo o que me causa gastura,
de tudo o que eu quero de fato,
eu peço renúncia.
Deixo para a vida o cuidado,
o toque do belo,
deixo para a vida o zelo,
o que for abençoado,
nessa vida tão simples, e tão singela,
eu quero o básico, o extremo necessário,
a catarse da quimera.