Tudo tem mistério

Farinha pouca, meu pirão primeiro,
falar de beijo, de libido é pouco,
espero mais dos seus ancestrais,
já chega de bacanais virtuais

Para os desafetos do tempo,
o avesso dos ponteiros,
quem entende dessa história,
sabe que já era, é mágoa,
é hora da virada

Para os atentos da própria sorte,
ser forte é brevidade,
seus ensaios de cores falaram mais das dores,
que as flores de rosas

Para os aventureiros, celeiro de inéditas,
prisioneiros dos misteriosos áudios, o óbvio não precisa ser dito;
é um rito se reinventar, a tecnologia não vai ajudar tanto assim,
parte de mim esse som, radinho de pilha, ainda, para os desvalidos,
fone caríssimo para os famintos de humanidade,
estúdio dentro de casa, estudo dentro de mim

O convidado

Não lastime se as pessoas ao seu redor não caminharem o passo largo do progresso,
cada um tem sua missão e o tamanho daquilo que precisa enfrentar,
não cabe zombar, tripudiar, fazer piadas, é a mais alta farsa;

Se acha mesmo capaz de compreender o próximo, então aceita o limite dele.
Sabemos do desejo de progresso, por certo é nosso também, nessa esfera espiritual.
Mas, não importa a pressa, não importa se agora, daqui a pouco ou amanhã,
é o aprendizado que conta, não afronta, de nenhuma medida, a doutrina da vida.

Que é ela quem sabe, é ela quem rege o tempo,
a intensidade do firmamento, a profundidade do que toca aí dentro,
é ela – a vida – a escolhida como a mais forte experiência

Não julgue, não aponte, não critique, não deixe de olhar, de novo,
para a sua parcela de contribuição, para a sua parcela de amor,
acredite, tente, dê nova oportunidade, abrace, acalme-se,
cubra-se com a força que a vida deu, a capacidade de fazer a diferença,
entra, sem tocar nas feridas, sem tocar nas dores

Sabemos que você entende os recados, é canal de fato da nossa mensagem,
utilize toda a energia que sabemos movimentá-lo para fazer o elo, a ponte,
a costura, a ligação, para ser anfitrião do amor de Deus,
quando for convidado a participar da vida de outra pessoa

Verão-luz

Não canse de ser luz,
não deixe de ser luz,
quando entrar nas sombras,
não perca a luz que Deus deu

Não se aborreça
se cegos ficarem
aqueles que se incomodarem
com a claridade, é parte
da missão

Dá missão, Senhor, aos justos de amor,
cubra com seu manto protetor, e chama
bem junto, bem perto, bem próximo

Acalma o próximo,
o óbvio também precisa ser dito,
não se canse de repetir,
nem de escrever,
não se canse de ser,
canal de Deus,
não é o ego que nos alimenta,
assenta o coração em Cristo
e nos muitos amigos que verão-luz,
estação divina

Outro olhar

Hoje eu não vou falar dos seus olhos,
nem de sua pele simples, do seu sorriso de menino,
nem dos seus sonhos, não vou falar dos seus lábios,
nem dos afagos que um dia eu sonho em dar

Hoje eu vou falar do ser que sofre,
que se cala quando a dor é grande,
que para, quando o mundo é mais forte,
vou falar das suas mazelas,
do seu choro perdido,
vou falar do seu vício de carência

Hoje eu vou falar das festas sem sentido,
vou falar dos seus falsos amigos, socialmente,
vou falar das provas que você precisa contestar sempre,
do preconceito desmedido que insiste em te colocar em qualquer nível

Vou falar da academia que te suga o corpo, e o intelecto também,
vou falar das suas roupas, dos seus trajes, vou falar dos seus hábitos,
das suas fotos, suas poses, seus caprichos, vou falar de tudo aquilo
que a gente sabe que é o humano construído para se apresentar

Vou falar do seu crachá, do nome social que você escolheu,
hoje eu vou falar da ansiedade que convenceu você de me dizer coisas estranhas,
vou falar da perturbação que não te deixa dormir, te coloca insônia,
vou falar dos homens que você beija, se oferece e cansa das velhas bocas,
dos corpos rígidos e flácidos demais, dos atos que não preenchem mais nada,
dos prazeres que te entristecem depois de vinte minutos.

Eu vou falar a realidade, o humano que sofre na carne, na alma,
eu vou falar com calma e no verso para não te machucar de frente,
eu vou falar de gente: normalmente o poema serve pra amenizar,
para a ilusão e para o utópico, mas, hoje, só hoje
o poema vai cuidar da ferida que eu tento curar
falando dos seus olhos, que não me deixam mentir,
outro olhar

Valsa

Valsa a sua angústia que cruza as pernas, irada,
valsa a sua insegurança no firme passo acima do salto,
curve-se entre a direita e a esquerda, deixe-se seguir
com seus olhares tão precisos, aterrorizantes
tão impostos, feito frieza que não se deixa fugir

Valsa a sua ira cardíaca no suor tão escorregadio,
que a guerra entre o seu tronco e o meu contato físico
sufoca o seu espartilho, como um golpe para ver quem vence,
mas, o seu leve, leve e traz não se dá por vencido,
sussurra ao meu ouvido que o seu vício é a dança erguida,
arranha a minha carne viva, do pescoço à virilha,
queima viva viúva negra, como água-viva, em azul-turquesa,
como no fundo do mar

Valsa firme, convence sem pestanejar, é dona da cena,
alimenta a própria métrica, o próprio ritmo,
quando a sua dança, não mais dança, mas…
quer matar, quer matar, quer matar
para fechar o espetáculo, que vai…
continua, continua, nua, a me descortinar…

Goteja

Coração nobre, puro, cheio de vida,
de alma leve, sê forte, cativa,
poesia no gesto, na palavra modesta, bendita,
tem carinho nos olhos, pedra de turmalina,
tão antigo, amigo, que analogia nenhuma
pode ser suficiente, ainda que a lua fosse entregue,
não tem símbolo poético que se preze,
nem os milhares de corpos celestes,
do firmamento de prece da palavra abriga,
que saúda, e que venera, que corteja,
a poesia que hoje goteja pelos olhos
brota no fundo do poço d’alma companheira..

 

*Para Iago Santos

Decantei de você

Desencantei de você
decantei um amor que supunha ter
descansei da dor de amar você

E sem brincadeira, sem o jogo de palavras,
você não me cala mais nos dedos,
meu desejo não proporcionado…
ao seu lado eu seria feliz
e fui, sem você

É fato que, de apenas um lado,
também existe o fardo do gostar de querer
e quer saber, valeu a pena,
mesmo que a sua alma mesquinha e pequena
não tenha notado o halo do amor mais falho,
o humano

Dê conta

Você afronta
depois, desgraçada,
acha que não dá conta
e eu, bancando a tonta

Faz de conta que a onça
não domina a floresta,
nesse mito do leão ser o rei da selva

Sei que você é do contra,
felina, astuta, caminha entre as tantas
sem se gabar, não mede esforços
enquanto os seus poros…
respondem que vão me dominar

Tecer

Estou assim leve,
pra que você tenha oportunidade.
Vem, me conhece, como quiser,
hoje estou pronto, e alegre.

Não precisa me enaltecer,
há ainda o que ver,
existe no que acreditar,
sei que depois de muitos tropeços…
o que cabe é desconfiar

Fia, sem freios; volta a fiar,
e cose, de novo, volta a costurar;
vai fazendo a peça, junta os pedaços;
vem tear, tatear, experimenta;

Se ajusta, volta a apertar; modela;
veste, vê se cabe; cai bem; roupa nova;
cheiro de novo; consome; paga o quanto achar que deve,
e volta a usar; procura a minha ocasião,
até desfiar; remenda; reaproveita; enquanto eu quiser,
por favor, me doar…

Aromas

Passou o tempo,
é o meu momento,
coisa nova, a aurora,
independe dessas farsas,
cansei das farpas que você colocou

Estou retirando uma a uma,
e agora já não dói mais,
a liberdade me faz sorrir,
com o livramento que a vida me cedeu

Concedeu, o tempo, um turno novo,
nessas rodadas que a vida tem
de uma hora te fazer sorrir
e noutra, o desgosto…

Seu gosto, seu cheiro, seus gracejos
não ficam mais na lembrança,
sou criança de novo que redescobriu a graça de amar

Não precisa ir embora, nem precisa ficar,
deixa a vida decidir a melhor forma
a se podar, as flores, para retirar os espinhos,
os versos meus são novos aromas pra se respirar…

Hoje eu entendi quem mora em mim,
e quem merece o frasco, fraco,
o fiasco da amostra grátis,
que perfuma um pouco, mas ninguém pede,
só passa no pulso e deixa passar…

Falta

Falta, se não chegar na hora certa,
falta, se não for ao serviço,
falta, se o dinheiro não cair na conta,
falta, se o médico remarcar a consulta

Falta, desconta na folha de ponto,
falta, um tanto para o fim do ano,
falta, um bocado para fechar o mês,
falta, uma conversa franca, forte

Falta, o espaço que você deixou em aberto,
falta, o olhar sincero que já me responde,
falta, a segurança que a sua presença me fornece

Falta, o amigo que caminhava comigo diariamente,
falta, o poema que a gente vivia dando risada,
falta, o dia a dia da piada pronta com a correia,
falta, a pausa do café, que frio, você aquecia

Falta, a nossa prece em grupo,
falta, alguém por perto que me diga:
“falta, você confiar mais em você” e,
“falta, nada não, segue em frente, vai, confia”

Falta, a simpatia que acalma o dia,
falta, o norte que você escreve,
falta, a sensibilidade da alma gentil,
falta, a falta que você nunca fez,
falta, a leitura dessa confissão,
falta, a sua presença faz, mas nunca ao coração;

Falta, acabei de fazer
falta.

Alimento para a alma

A calma de hoje
vem da passagem
da tempestade de ontem
– que revolta -, mexeu com todos os sentidos.

Das reviravoltas do tempo, que ontem me fez chorar,
dos revezes que a vida coloca, eis a sorte de sorrir de novo;.
A ferida aberta, fecha uma hora, passado tanto tempo;
uma hora, se não passar, passado será você.

Não carrega o ontem nos ombros,
não se pese com os acontecimentos,
seja livre, leve, eleve-se, entregue
o que for fora da sua competência;
a vida só te deu ciência,
não pediu pra você resolver…

Passa pra frente, deixa para o próximo,
cada um sabe o que pode fazer e como agir,
assim, é seu atributo, ser canal do mundo,
adubo de ajudas e contribuições.

A colheita, quem fizer, é o mais necessitado,
mas não sem antes preservar a terra,
cuidar da terra, semear a terra, preparar a terra,
ceder a terra, sem antes a intenção de reservar espaço,
para amar quem vai comer.

Tens sorte

Tens sorte
por ti, enfrentei a morte
sê forte, eu voltei
fui lorde

Tens sorte,
pedi a posse
dessa vida

Tens norte,
agora que eu voltei,
conforte, que nasci

Tens sorte,
que fui atendido,
demorei a te encontrar,
nesse mundo perverso e sofrido

Tens sorte,
que te achei, ainda cedo
com a ilusão de apenas uma vida

Tens sorte,
que a gente se ame
tanto e muito forte
nessa vida, nessa vida,
nessa vida, e nessa vida,
tens sorte…

Voltei sem ir

Por confiar na vida,
no que eu sinto,
e no que sei ser verdade,
confio em mim também

Confio em você
toda vez que me diz,
com a sinceridade nos olhos,
com a expressão da verdade,
mudamos de vida

E que bom quando você me inclui no plural,
e eu penso em você em dois, em numeral,
quando a preocupação é de carinho
que a verdade do amor que cuida, conhece

E quem ama de verdade, não precisa de prece,
porque já se guia no bem, e você sempre será, meu bem,
e eu sei que sempre me quis, seu bem, mesmo sem saber como agir

Por mais que tudo mude de rumo,
nossas curvas se encontram de novo,
é um ir e vir, arrumo desculpa para partir
sabendo que ali na frente tem sempre placa de retorno

Retorno, dolorido e culposo,
voltei pra sua vida de novo,
e de novo, e de novo

Porque não há saída para o outro
que encontra o amor, não há;
é um eterno conquistar-se no outro,
e no outro se deixar ir um pouco,
de novo, de novo e de novo…

Em tramitação

Estou em processo
de construção da vida,
de desapego do ego,
de desprendimento de vaidade

Em processo de saber viver,
aprender e aprender ser,
ser melhor, menor,
mas, sem falsa humildade

Estou em processo de metades,
relativizando o que vale a pena.
De verdade, muita coisa já não vale mais,
mais nada, sem curiosidade, sem entrega,
desapega, desencosta, agora e com sinceridade

Estou em processo de verdades
que não foram fabricadas pra machucar,
são só constatações de resultados parciais,
uma vez mais

Estou em processo,
dinheiro não me compra,
situações não me obrigam,
o afeto não me pressiona,
a grita não me cala

Em processo de ser eu mesmo,
de me colocar a par do meu próprio eu,
descobrir onde está a outra parte de mim,
que não cedeu ao mundo de outro,
ao amor de outro, ao calor de outro,
desejo, outro, expectativa do outro,
serei inteiramente meu

Melodia lunar

Cruzo sua vida
volta e meia, rodeia
e deixo a mão aberta
fim do passo que desencadeia

Sigo em frente
dou a mão a outra gente,
rodopia à minha frente
e a mente, ziguezaguear

Fecho o passo sorrateiramente,
sorridentemente, retiro novo par
e na vida da gente, uma nova música,
toca, e gira, retoma, repete,
com pessoas diferentes
a melodia lunar

Falso passo, o improviso,
o impreciso também coreografa,
abre e fecha, e me arrasta
alastra sua alegria pro lado de cá

E quando não se espera,
o contrário do contrário
que ninguém sabe onde vai dar

Corre e sai pelas laterais,
tangencia as minhas emoções,
expressão do corpo que se joga,
acopla suas pernas na minha vida
e avisa que o número vai fechar

Presente divino

Eu estou falando com um ser de fé,
eu estou falando com um ser de luz,
estou falando com um amigo que me conduz

Estou falando de igual pra igual,
ainda não há semântica para o imaterial,
o pós homem, o sobrenatural, o divido,
o divino que me diverte em você,
que me enche e me alegra

Estou falando de um encontro
muito mais evoluído, que explora,
expande os sentidos, além da matéria

O que é ser, ser de luz?
o que é ser, o ser você?
o que é ser, se alegrar por mim?
o que é ser, transformar-se?
e mais ainda, aos outros?

Por amor, por cuidado, pelas atitudes,
os abraços apertados que não cabem no mundo,
a presença que emociona a alma,
a voz que vibra a eternidade,
a segurança na fraternidade

O que é ser presente na distância?
o que é ser perseverante no difícil?
o que é ser descanso no impossível?
o que é ser seguro do que eu digo?

Presente do divino,
presente do divino,
presente, tá me ouvindo?

Fonte de mudança do mundo,
caminho de luz e amor,
esperança aos sofridos,
esperança aos pequenos de espírito
e aos pequenos espíritos de luz,
formando-os no bem sem indiferenças

Presente do divino,
presente do divino,
presente, tá me ouvindo?

Agora você sabe,
agora você acredita
na infinita bondade da vida…

Traçado de encontros

Quando eu te achei
ao acaso do destino,
desculpe, eu não sabia
que era amor que recebia

quando eu te vi a primeira vez
por outro impulso inesperado da vida
eu entendi o que eu não entendia,
o que eu escrevia, mas não vivia

Sei, que no entanto, contos de fadas
não bastariam, acima de tudo, para a nossa sintonia,
e você sabe com clareza que a única certeza é a de que eu,
ah, eu ficaria – e que ficarei sempre!

E estou aqui, dia após dia, ato após ato,
certo de que não se faz milagre com o jogo das palavras,
que a minha retórica não justifica resposta alguma,
nesse tempo de farpas e calúnias, mas pela luta,
pela conduta de um carinho que não se basta em si

Nesse tempo, pós planos meus,
na certeza do que eu aprendi,
do pouco que eu um dia insisti em receber,
é por você e por mim que eu estou aqui
duzentos e setenta e cinco dias

Vivendo e aprendendo a acreditar no ser humano,
a crescer, e ser o que sonhamos, fazendo das saídas,
das músicas e de pedaços de pano as provas
cada vez mais palpáveis do que os supostos desejos,
mais do que os sentimentos mais sublimes dos nossos anjos
poderiam querer em um traçado de encontros

Você sabe que eu te amo

Se você sabe que te amo,
sabe também que se dependesse de mim…
Não sairia de perto de você,
nem soltaria a sua mão mais,
se dependesse de mim
você faria parte do meu dia,
todo dia, o dia inteiro
não em pensamento mais,
nem em poesia mais,
mas no toque suave,
no olhar franco,
sincero sem medo,
do pranto do amor
que, se cair,
não me envergonho
de amar você

Você sabe que te amo

Você sabe que te amo
e se sabe mesmo o tanto
que contemplo e componho,
e acompanho um sonho
quando te conheci…

Se sabe que te amo,
sabe que isso não é de hoje,
nem pode ser, pois meu ser sabe
reconhecer um amor antigo,
mais antigo que a vida que a gente leva,
porque seu carinho me eleva ao mundo das ideias,
dos pensamentos que nunca tive, os mais sublimes
daqueles que a gente só cogita e se agita
se estivermos juntos

Segredo

O que faz teu apreço
virar prece pra mim
o que fazes tu que não podes me ver
que já queres dizer, preze por mim

O que eu posso dizer senão
que a sensação não é de toda ruim
ando merecedor do teu calor,
de conduta afim

Que sintoniza comigo
o perigo dos preços,
os pesos de múltiplos carinhos

O que dizer se o teu sossego
é por todo no contexto de gostar de mim
O que dizer se o meu sossego
é segredo que eu já deixei partir

Senil

Tua sede cede cedo ao meu desejo
almejo o beijo e me deleito
em conforto do teu peito
o porto disposto em barcos
e arco de ser o décimo quarto
a chegar perto

O elo incerto do perfeito hoje
que não termine o infinito hoje
que não cesse o amor eterno
o eterno agora da memória

Teus gracejos são oriundos
dos mais profundos sentires
do mais simples dos agires
inocência gentil

Tua experiência entre mil
é novidade generosa
pôr do sol sutil
romance idealizado
um e o outro
senil

Bom reconhecer

Muito prazer,
bom conhecer você
hoje te encontro,
nossas vidas,
cruzando-se

Muito prazer,
a memória humana falha,
mas a vida trabalha,
ela nunca mais vai nos esquecer
bom conhecer você

Muito prazer
hoje a gente cria um portal do futuro,
o presente se vive junto – ou não -,
mas lá na frente, sobretudo,
quando o corpo não nos representar,
e a memória nos trair,
o sentir vai nos reconhecer e nos reconectar

Muito prazer,
hoje tudo começa
nessa arte onde a vida prega
(peças, talvez)
nessa arte onde a vida prega
amor ao próximo,
muito prazer e até logo

Daqui a dois dias,
daqui a duas décadas,
não interessa,
está tudo próximo

Desconstruindo pessoas

E quando não se dava nada por alguém,
a doação total constrangeu,
e quem disse que o mendigo na rua
é coitado, a compaixão dele cedeu
a partilha do pão de ontem

E quando se achava um ser humano perdido,
perdido foi o ego ferido, quando ferido,
por aquela mão que se estendeu

E quando o cuidado necessário se fez presente,
mas o dinheiro não pôde bancar,
quem nunca foi cogitado se ofereceu sem centavos.

O idoso moribundo ainda pode cuidar das crianças,
a criança frágil e pequena diz verdades escondidas das outras bocas,
o jovem imaturo também ensina que a coragem não se ensina,
quando o sistema sufoca tantas adultos maduros,
o deficiente é servidor público que trabalha e não foge do ponto,
e o ponto final é só um blefe.

A vida nos pede a reincidência das reticências

Una-vida

De braços abertos a vida nos recebe
felizes que somos, a vida prevalece
sorrindo constantemente

Temos coragem para aquilo que nos propusemos,
nós fizemos um acordo: nem sei se assim, secreto…
Nem tudo é sofrimento, nós vemos o que queremos,
lapidemo-nos

O planeta se coloca como um afinado instrumento,
escola maravilhosa para o crescimento, aprendemos
querendo ou não querendo, a escolha já fizemos
construiremos o mais limpo som, refinaremos

Os ouvidos, as falas, os atos e as atitudes,
os ciclos que a vida propõe são fatos,
inegáveis e caros para aqueles que não vêem

Aqueles que enxergam mais longe e mais lúcidos
percebem que a sabedoria da vida não tem hiato,
não existe nenhum vácuo para a dúvida, última
via das vidas e outras curvas, ensinam na hora
que o antes, ontem, o hoje, o agora e o amanhã,
depois, pois, cruzam-se em eternidade
um grande espetáculo de arte, vida-una

Soleira

Sua janela
está sempre aberta
está bem próxima
quando eu preciso
olhar para fora de mim

Estou sempre atento
quando ela fecha,
e quando ela abre demais,
retraindo-se na solidão,
ou abrindo-se para a imensidão

Eu também aprendi
a olhar para o outro lado,
o lado que eu não vivi,
mas que eu vejo que precisa
de reparos, amparos, cuidados,
conservado no silêncio
que sempre diz muito de nós

Eu não estou só,
você não está só,
eu vejo sóis em dias de chuva,
quando se chora por nada
eu vejo chuva em sorrisos de sol
quando inunda a felicidade passageira

Eu vejo na soleira da janela
o cuidado que a vida tem comigo
pra me proteger no abrigo
do amor que você não tem ideia que possui,
dois céus gris, fizeram-se, então, azuis