Pirataria

Saiba que tudo a um poeta vira motivo de escrita.
Mesmo que a vida não rime pelos momentos difíceis;
Mesmo pelas coisas mais banais e fúteis.

Tudo é razão ao poeta, mesmo sem razão alguma;
Dos teus belos olhos, aos teus mais irritantes defeitos;
Desde tuas saídas à noite, até às noites de romance;

Não devo explicação a ninguém, mesmo que tu sejas a minha pergunta,
mas as respostas não são, exclusivamente, a ti, são de todos – isto é arte.

A inspiração é tua, o trabalho de decodificar sentimento é meu;

Não cobre direito autoral;
Às vezes, o sentimento é original,
mas o poema, ah, ele pode ser pirata…

Acompanhante

Resolvi te ligar,
você não atendeu
fui em sua casa te buscar,
você não estava.

No bar onde gostamos de ir
você bebia com amigos, sorridente
Eu, todo contente, fui ao seu encontro
e até achei estranho você me ignorar

Mas sabia que nossa relação não era por muitos conhecida,
resolvi então me afastar, voltei para casa, sem reação alguma,
esperando o seu contato ansioso, tentando se desculpar

Mas você não me ligou nesse dia, nem no seguinte,
nem nos dias que se passaram, então resolvi não insistir.
Só depois de muito tempo encontrei na minha caixa de correio
um envelope como aqueles que sempre vinham do seu endereço

Solicitando com certo desprezo que não lhe procurasse mais,
que a sua vida tinha tomado outro rumo, e que a nossa vida não tinha sentido mais.
Eu sabia, antes de tudo, que essa carta um dia chegaria porque nossa aventura,
a nossa loucura acabaria!

Você sempre me dizia que era apenas um contrato, um acordo de amor,
e eu, eu encantado, com tudo, concordou.
Seria seu amante, seu cuidado e seu cuidador, esse garoto dos classificados
que agora virou ocupação: Esse tal de acompanhante para festas, encontros, seja lá o que for…

Mandou-me uma carta solicitando os meus serviços, e por carta me dispensou…
E eu, cada dia mais apaixonado, confundi trabalho com a profissão do amor

Coadjuvante

Acho que aprendi a me apaixonar
sem essa entrega toda, como se a minha vida acabasse agora
sem essa angústia de não ter, sem essa lamúria de sonhar demais

Apaixono-me agora, calmo
Calmo porque a vida merece calma
Sem esses tropeços juvenis
Essa correria infeliz que estraga tudo

Agora eu quero calma
Apaixonar-me pela cadeira de balanço
Apaixono-me pelo sol em meus olhos, manso e suave
Apaixono-me pela grama verde-amarelada, e pelas rosas que de rosas não têm nada

Apaixono-me agora sem compromisso e sem cobrança
Ainda não sou omisso ao coração, mas aprendi a sustentar um amor
Esse amor que quer morar em mim em vez de se jogar ao outro
Esse amor gostoso que está morno em mim, que de vez em quando se aquece
Esse amor que não transparece mais assim, tão brutal

Substituí esse amor de animal racional
para amar racionalmente, na espera
Esse amor que precisa, antes de grito, silenciar-se,
e não muito tarde, fazer notar-se em mim, primeiro

Segundo plano, nem sempre é coadjuvante
mas agora, não mais que antes, vou atuar o meu amor aqui
e contracenar contigo como parceiro, sem me esquecer,
por inteiro, que o ator principal sou eu,
mas sem você não há espetáculo algum

Assim

Assim meu verso calado pra você meu amado, assim meu verso
Assim te amo, assim mudo, sem nenhum motivo, um mundo,
meu mundo é você pra descobrir, pra desvendar

Assim, não dá pra falar que meu encanto é um tanto acanhado,
e meu canto tímido, encabulado só pra você!

Assim declaro meu sentimento, em canção que vem ao vento,
é-me um talento, admito, mas admiro mais em você essa possibilidade,
essa sua parte de tirar de mim, assim, palavra por palavra como quem tece,
assim, como quem costura um manto, o nosso instrumento de calor,
esses nossos momentos para se fazer pensar que, ah!

É o nosso frio, juntos, que me aquece….