Saudade em verso

Pelo reflexo do espelho
vejo a caneta correndo
alucinada, toda torta
em desespero

Relataram a Deusa
que foi embora
e deixou seus lindos versos
– ora, não li nenhum

Emocionado, eles me tocaram
pela fala saudosa de
terceira pessoa

Há por todos o respeito
da simplicidade daquela
alma que não deixou
ninguém

Presença incontestável,
em nosso meio respeitada
pela arte e pelo zelo,
apreço pelo belo que
surpreende a passagem
do tempo e do verbo

Sem medida

Já rebaixei amores à amizade,
e elevei amizades ao amor,
tudo bem se me enganei,
inverti os sentimentos,
mas não os inventei, nunca!

Não importa se me mostrei
forte ao forte,
fraco a quem era mais ainda, fraco

Sendo franco, não me arrependo
de nenhum ato prematuro,
nem de ser ultrajado de imaturo

Coração maduro vira pedra,
não pulsa, está sem vida,
enrijecido pela agonia

O equilíbrio da balança
não é perfeito em minúcias,
o simples vento que sopra
tem seu peso, atrapalha

Espalha certo desconforto
confronto de um todo
sem medida

Óculos

Para Flávia Marques, colega de classe do curso de Licenciatura em Letras/Literaturas do Instituto Federal Fluminense, primeiro semestre.

———————————————-

Há em mim uma semente
germinando latente
querendo você

Há em mim qualquer
tentativa de acolhida
corrida das palavras…

Em versos arrumadas,
sem querer parecerem vagas,
oh, ou, pobres-coitadas!

Na palma da mão, o beijo;
Da delicadeza do desejo
de quem ainda cumprimenta
damas da realeza…

Ainda que você não se dê conta
– tem que se dar conta –
da sua beleza!

E não recorra a nenhum conto,
nem mascare seus desencantos
com maestria, que mesmo assim
eu lhe respondo sem falsa companhia

Mesmo que você se finja de ponto,
vou fazer de você mais outros dois pontos
sem querer explicar nada, contínuos

Continuo contigo propondo
enquanto você se vê finalizando,
eu, apenas reconheço recomeços,
voos longos sem máscaras à aparência

Pareço quem sabe louco, que me diga,
não me importo, oportuno é deixar claro…
O que é claro como o vidro dos meus óculos:
Sua beleza que enxergo, sem exageiro dos quatro olhos

Começo

Eu queria entrar no seu mundo…
Ah, se eu soubesse um jeito
que te agradasse, qualquer um…

Usaria dessa personalidade
para me aproximar de você,
em segredo, é claro
ainda tenho medo de transparecer

Eu sei que preciso dispensar
certos cuidados, caso queira…
Mas ainda me falta coragem
para o passo em falso ser certeiro

E eu não tenho mais certeza de nada,
tudo se confunde e nem a água me acalma mais…
Eu não sei se sou capaz de abandonar
todo o conformo e o comodismo
para me aventurar em um labirinto
cheio de armadilhas

E se eu ficar preso
por anos aí dentro,
se eu me perder de mim,
e mesmo assim não te encontrar

Vou vagar entre o amor
e a busca dele, vou
me arrastando pelo meio do caminho

Nem sendo eu, nem sendo você,
sendo o vazio da espera que não chega ao fim,
e o fim que não sabe onde foi começo

Reencontro primeiro

Faço melhor se me permite
cansei de ser só, ser triste
encontrei você com alma
simples, próxima da minha
coisa de empatia, carinho
nostalgia de quem conheço agora

Por hora, careço de explicação,
confie em mim, ou não
descobri que já lhe conheço
sem ter visto, de qualquer jeito
loucuras da visão

Olhei pra você com carinho
apostei, sem sentido,
não busquei nenhuma forma
de compensação

Não pedi nenhuma garantia
de que você de mim gostaria
amor, seria pedir demais
não me arriscaria tanto assim

Se quer saber de mim
fui louco, leviano
fiz com você tantos planos
sem saber se estaria nos seus

Mas seus olhos encantam os meus
os nossos quatro se refletem
e nós dois, em cada quarto,
vivemos trancados de coração
aberto de contradição

Mas o que importa,
o que interessa
não é nenhuma pouca promessa
de amizade, ou seja lá o que vier
não espero nada de você,
só sei que vive em mim
você que eu criei assim
perfeitamente errado,
intuição acertada não pede trocado

Trancado tenho você
liberto em meu peito
solto em minha mente
sem pré-conceito
somente um pré-desejo
de compaixão

História

A semente do livro foi plantada,
coisa rara esse meu pensamento
quero tratar de amor em história,
um romance, a ideia vem crescendo…

Versos breves de quem vai se arriscar
pelas linhas corridas, pelos parágrafos,
um dia, quem sabe, as minhas palavras
dispostas de outra forma também não encantem…

Agora não há pressa,
cobrança do tempo, não interessa
vou aprofundando esse desejo,
começando pelo lampejo de como
almejo fazer isso de forma inovadora

Seis anos se passaram
meu pensamento é quase automatizado,
construo versos até falando,
mudança de hábito vem se ajeitando

Preciso ceder, uma vez na vida
fui vencido pelos meus poemas
seria hora de férias ao poeta?

Sangue frio

Sou naturalmente um apaixonado
Escolho com cuidado os possíveis merecedores
É tanto carinho guardado, espera incansável por valores

Não quero a pessoa perfeita, reitero a minha paixão.

Esse sonho de senso comum não me encanta,
a vida me ensinou desde criança a ser realista
dentro de tanta limitação

Ensinou-me a ter paciência na espera
e a contemplar a pessoa certa
sem alarde de quem sabe o que faz

É preciso ter sangue frio para saber
quem vai ser capaz de te esquentar
com muito mais calor do que o apenas carnal

Estações diferentes

Para Marilia Siqueira, Letras/Literaturas, Instituto Federal Fluminense, Leituras Orientadas I, Primeiro Semestre.
—————————————————————-

Eu preciso ver a poesia
no que você apresenta,
preciso trazer para o meu mundo,
mesmo que pareça fora de contexto

Preciso arrumar um pretexto,
um precioso desejo de me encantar
pelo que você faz, fala, demonstra

Eu quero, necessariamente,
o lirismo, a sutileza
que toca na alma
e não apenas à mente

Não minto para você,
não preciso ser conivente
com o que eu não entendo

As nossas razões não se compreendem,
alguém precisa ceder, um de nós;
Ou nós dois, quem sabe

A música pode tocar em estações diferentes,
mas vem em momentos díspares parar em cada ouvido.
A você eu grito para que me escute de longe;
ou você para o passo para que eu a alcance

Sintonia nós temos, não nego
falamos do mesmo assunto,
temos o mesmo gosto, espero
tentamos nos entender no mesmo espaço

Sincronia é o que nos falta
poesia na mesma hora,
o entendimento do mesmo verso
para que o debate não fique vago,
e nós não divaguemos nos debatendo

Cartada

Está proibido
de se despir de pudor,
eu não quero mais

Essa sua atitude de solteiro,
solto aos prazeres, chega
agora é comigo…

Eu sei que esse fogo não acaba,
coisa de gente quente,
testada pela vida.

Sou carta curinga
que vence o jogo,
sei que você não é bobo

Me escolheu porque temos
a mesma sintonia,
apetite que não sacia

Finge que não sabia que era amor,
mas nas entrelinhas a gente entende,
que de inocente você não tem nada

Mas de vez em quando ser sonso
pode ser bem convincente,
uma alternativa de sedução

Eu também cansei de aventuras,
de não ter um caso firme,
mesmo que não seja cotidiano e metódico,
podemos construir o nosso próprio jogo
sem azar na partida

Não precisamos perder a emoção,
a volúpia que nos envolve,
que nos deixa em transe
com tantos caras diferentes

Mas chegou a hora de demonstrar
as nossas muitas caras para o mesmo cara,
ficar cara a cara com um só
para sermos muitos nós,
sem nenhuma amarra

 

Bruxa

Pode ser que dê certo
mas se eu disser que não quero,
que cansei de me machucar,
não há curativo que seque,
não é ferida que feche,
cansei de remendar

Não vou viver feito maltrapilha,
farelo de milho não faz pipoca,
eu gosto mesmo é de fartura,
essa falsa candura não vai me ganhar

Cansei de você,
não vou me vender,
nem ser trocada
por vale-promoção

Eu não vou pedir mais nada
cansei de música cantada,
cansei até de cobrar alguma coisa,
de baboseira estou cheia,
não vou mais buscar agulha em palheiro,
ou os uso para limpar os dentes,
ou os queimo

Sendo bem esperta,
agulha é feita de ferro,
ela vai sobreviver as chamas

E eu vou perfurar a cama
para me divertir com raiva,
fazer tipo de sanguinária
para assustar a vizinhança

Até que achem o colchão rasgado,
queimando alto todo aquele mato
que ninguém corta

Vou assustar todo mundo
bancando a louca moribunda,
com cabelo desgrenhado,
com a louca conduta de rasgar o céu
com gargalhada de bruxa

Tentativa

Claro que podemos voltar naquela conversa antiga
podemos, sim, claro, por que não, bater na mesma tecla?
Há alguma regra que nos impeça de voltar ao passado?
Será que devemos abraçar o clichê de não reviver pendências?

Pode falar do outro,
você sente ainda falta, não é?
Ainda não seguiu adiante por isso

Insiste mais um pouco em se machucar
que mal pode ter em querer sofrer?
Quem foi o juiz que determinou
prazo de validade para se esquecer…

Eu sei o quanto você ama
mas não quero ser repetitivo
palavras de amor o tempo todo
cansam o corpo, a mente e a alma

Calma, não estou lhe cobrando
não há juros na vida,
não se preocupe com tempo perdido
o tempo é daquele que se sente vivo

Eu não peço que você deixe de chorar,
se é que você ainda tem essa vontade,
não precisa negar, não economize água.
Ela sempre volta à natureza

É da natureza de quem ama o sofrimento
simplesmente no momento em que se ama
apenas de um lado, é um fato

Ainda assim é amor, meu caro
ainda assim é amor, é seu amor
é o seu amor, mas o amor é seu
mesmo que ele tenha lhe abandonado
mesmo que ele tenha abortado
o amor puro que a ele foi doado

Você não foi doido por ter tentado,
ora, não fez nada de errado,
e essa dor que você sente…

Não adianta, não mente,
só a está sentindo
porque, no mínimo,
apenas o ato de tentar
valeu a pena

Espera aí

Espera aí, deixa eu tentar explicar
o que você viu não é bem assim…
A vida cria armadilhas
pra vê se eu quero mesmo viver

Talvez você nunca me entenda.
Talvez eu seja mesmo complexa
Talvez eu não queira ser entendida,
só vivo entendiada

Eu não inventei nenhuma história,
mas eu acompanhei a sua própria.
Talvez eu tenha feito errado.
Talvez eu devesse agir de outra forma

Mas quando eu fui pensar no mal
que estava fazendo a nós dois,
depois, não tinha mais jeito

Eu tenho consciência de que não sou
tudo o que eu gostaria de ter sido.
Nem tudo o que eu digo tem sentido,
mas boa parte desse todo,
talvez você, tolo, acreditou

Mas não que seja mentira.
Espera aí, não agrida
a nossa amizade dessa maneira.

Nem tudo o que disse foi asneira,
sempre há um fundo de verdade
nas minhas palavras

Desculpe se não estou sendo clara,
não é essa mesma a minha intenção.
Eu só faço alusão ao café e à música,
não que ela expresse o que me vem quente n’alma

Mas tem ajudado bastante a me manter acordada,
junto com as minhas rimas, reafirmam a coisa falha.
Errada fui eu quem aceitou você assim

Vou ter que assumir os meus atos algum dia,
devo começar primeiro na poesia a lhe dizer
que a culpa de tudo nem sempre foi minha,
há sua parcela também, mesmo que você não saiba

E se eu fico calada vendo o horizonte…
Não aponte o dedo em riste para me acusar
temos ainda muito o que conversar.
Eu e você (dentro de mim) precisamos do diálogo
ou eu jogo tudo pelo ralo do meu pensamento?

Eu quero convencer você que vive falando comigo
no íntimo, antes de todo poema,
para depois tomar coragem de trocar o café
e essas músicas de fundo do poço
por cair dentro de você de fato

E realmente eu não sei quanto tempo isso ainda vai levar,
quantas xícaras devo sorver com cuidado
para não me queimar com você

Mas eu vou beber, um dia
ainda bebo você, quente
um dia, eu bebo você

Embriago-me.
Mais dois dedos de você, por favor.
Não me venha dizer que acabou!

Camaradagem

A gente dá um tempo e volta,
três, seis meses, um ano
vício que retorna

Vou parar de você,
eu tenho força de vontade
sou eu quem manda em mim
com um estalo, sem alarde

O pensamento depois de um tempo
bate como pêndulo, eu quase,
quase acreditei que conseguiria
– e eu consegui pra falar a verdade –

E não tenho porque lhe aceitar de novo,
eu já consigo ser independente,
contente por não viver você mais

Mas pode vir,
eu permito mais de uma vez,
o magnetismo que nos puxa pela arte
explica esse sim,
camaradagem

Quero saber como anda
aquela energia que me tornou
poeta certa vez, até certo ponto;
Se ele anda fazendo versos bêbados
ou se está bêbado fazendo versos

Cinzeiro

Não cobro nada, só peço
devolve a minha vida,
dissolve essa história
que construímos juntos

Separa a sua roupa,
vá embora, não quero mais
gaveta juntos

Não reclama que tudo acabou
foi você quem procurou se convencer
de que eu não sirvo mais, vamos ver

Quem leva mais tempo chorando
a ausência do outro,
quem ainda acredita no retorno

Depois não se arrependa,
a Brenda fica comigo,
companhia de cadela,
alegria

Eu barganho com você, sim,
pode levar o jogo de copos,
beba o quanto quiser;
Leve o vinho também,
não importa se é importado,
não ligo

O urso dos dias de namorados,
aquele chocolate meio amargo
não tinha sabor algum
Não insista, vou queimar aquela camisa
que você me deu, não quero mais
deixar estampado, nem vestir a camisa
de uma velha rima sem vida

Diga a sua mãe que ela pode vir me ver,
mas se ela quiser saber de mim
para ser sua informante,
que ela procure cartomante

Não vou jogar nada na rua,
nem pegar suas coisas fúteis,
você que as leve, sem janela

Amanhã é dia de lixeiro
se não levar tudo hoje,
até aquele cinzeiro horrível,
vou jogar fora

Coisa cafona, nem sei porque lhe dei,
ainda bem que não me custou nada
roubei da funerária quando banquei
o caixão do seu pai

Que Deus o tenha, porque o filho,
de benção não tem nada, coisa ingrata,
nem ao inferno você desce

Porque ainda vai ficar na minha prece
para que não divida comigo mais nenhum espaço,
e se por acaso eu lhe encontrar na rua,
mudo de calçada para não lhe dar o prazer
de me ver mais feliz ainda

Porque essa sua aventura louca não dura muito,
já vi muitos casos assim, de gente burra,
achando que trocando de romance
vai viver o amor duas vezes